Sob o chamativo título “Juízes acusam solicitadores de estarem ao serviço das grandes empresas” o DN noticia aquilo que no entender do jornalista terá sido uma “denúncia sem precedentes entre operadores judiciários” da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, que supostamente teria referido, no seu “Relatório Preliminar sobre a avaliação dos bloqueios verificados na reforma da acção executiva e propostas de adequação para a eficiência do sistema”, “que os solicitadores de execução estão a servir sobretudo as grandes empresas financeiras. As pessoas singulares, que também recorrem aos tribunais para reaver o seu dinheiro em dívida, estão a ser remetidas para listas de espera.” (cfr. DN)
Fui reler o dito Relatório, - cuja análise e propostas, aliás, apreciei bastante -, à procura da dita “denúncia sem precedentes”, e a este propósito encontrei, apenas, o seguinte (cfr. Relatório):
“Por razões de ordem prática, e de organização interna que se compreendem, os grandes utilizadores da acção executiva, na generalidade dos casos, indicam sempre solicitador de execução. Contudo, porque entre o exequente e o SE não pode existir qualquer tipo de relacionamento contratual, os solicitadores assim indicados (em centenas ou milhares de processos), não deixam de constar das listas de nomeação da Câmara de Solicitadores, sendo, por isso, também oficiosamente nomeados, avulsamente, para outras execuções, com outros exequentes que não são utentes habituais do sistema. Este regime, na prática, permite que um mesmo solicitador tenha na sua posse algumas centenas de processos de um mesmo exequente (que sistematicamente o indica), e algumas dezenas de outros processos, de exequentes variados, com os quais não tem o mesmo tipo de proximidade, e que não pode recusar, uma vez que constituem designações oficiosas. Se é certo que não existe qualquer vínculo jurídico entre o SE e aquele primeiro exequente, o certo é que, de facto, toda a actividade económica do SE pode estar apoiada nas execuções em que exerce funções para aquele exequente, daí surgindo um interesse pessoal (e senão legítimo, pelo menos compreensível) em que essas execuções em concreto sejam tramitadas com prioridade sobre as restantes em que seja nomeado oficiosamente.
Mais transparente se tornaria o sistema se o SE fosse sempre designado pelo exequente, (..)”
Este episódio fez-me lembrar uma história do Asterix chamada “A Zaragata”, na qual César, na sua incessante procura de um meio para submeter a invencível aldeia gaulesa, enviava, em missão, o personagem Tullius Detritus, cuja especialidade era semear a confusão por todo o lado por onde passava. Apesar da habilidade do zaragateiro, os gauleses mantiveram-se unidos. Será a realidade capaz de igualar a ficção?
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