Afinal somos estimados! :-)

Rejubilemos, advogados! Afinal os nossos clientes até nos estimam...

Assim o demonstram os resultados de um estudo sobre a função social da advocacia, encomendado pelo Conselho Distrital de Lisboa da OA, divulgados aqui.

Mas para mim o melhor de tudo mesmo é saber que a Professora Maria Odília Teixeira, docente da Faculdade de Psicologia e Ciências da Comunicação da Universidade de Lisboa, entende que "(...)Neste tempo em que o tema da justiça é recorrente e gera na sociedade portuguesa algum mal-estar, apesar de não existirem sintomas de que o direito atravessa uma crise de valores, existem porém indicadores que apontam para a necessidade da classe, como um todo, e, em particular os órgãos dirigentes da Ordem empreenderem uma reflexão centrada nas questões de incentivar uma nova fidelidade aos valores que receberam e que têm o encargo de transmitir. Neste sentido, julgo que o titulo da publicação 'A função social do advogado' seria mais expressivo se considerasse como complemento- 'Exercício de cidadania plena'. Isto por que uma das ideias fortes do estudo é justamente a exigência de que os Srs Advogados são signatários da garantia dos princípios de cidadania e são também fonte do vínculo social de viver em conjunto, da construção colectiva, sem esquecer que na definição da justiça o conceito chave é a pessoa, como o direito atribuído a cada um.(...)" (cfr.aqui)

Fez-me muito bem saber que, afinal, o facto de ter escrito este texto não quer dizer que estou completamente tontinha, como, ultimamente, cheguei a temer... :-)

Advocacia preventiva ou... bom senso?

Há uns dias atrás li, no Jornal de Negócios, que "os portugueses levantaram mais dinheiro no multibanco este Natal e fizeram mais compras, e de valor mais elevado, com o cartão de débito" (cfr. aqui).

Hoje, o mesmo jornal refere aqui que "no Reino Unido o endividamento com o Natal deve levar 10 mil pessoas à falência até Abril".

Pensei: ena pá, tanto "lixo processual"!!!
É que no Reino Unido dívida dá lugar a falência, mas por cá traduz-se, regra geral, em injunção ou execução, ou seja... "lixo processual" :-)

Depois li aqui esta entrevista do Bastonário Rogério Alves, defendendo as virtudes da advocacia preventiva. Diz o Bastonário:
"A função do advogado numa consulta jurídica é esclarecer a pessoa sobre todo o sortido de assuntos, elucidando o cliente sobre o que deve fazer ou como o deve fazer. No entanto, a questão é que, muitas vezes, quando as perguntas nos são colocadas grande parte do problema já se gerou. A solução é mais difícil porque, mais do que prevenir, é preciso remediar. Seguindo este raciocínio a OA decidiu elevar a bandeira da advocacia preventiva com o intuito de transmitir aos cidadãos portugueses a seguinte mensagem: antes de se comprometerem contratualmente, seja por escrito ou de forma verbal, tanto no domínio da actividade profissional, como privada, devem consultar um advogado porque se aderirem ao espírito que justifica a consulta jurídica vão evitar despesas e demoras".

Pensei então: será que estes cidadãos, agora irremediavelmente endividados, teriam evitado problemas consultando antes um advogado?

Se sim, o que é que se aconselha a um cliente destes? Veja lá, é melhor não comprar a PlayStation III que o seu filho tanto quer! Em vez de um plasma, porque é que não compra uma TV normal? Ou então: acha mesmo que precisa de ir passar o fim de ano à Madeira?

Advogado sofre... :-)

O que não muda...

Li aqui que "o Governo iraquiano ordenou a abertura de um inquérito à forma como decorreu a execução de Saddam Hussein, em particular para saber quem gravou o vídeo que mostra o enforcamento, cuja divulgação está a gerar uma onda de indignação dentro e fora do país".

Isto porque "ao contrário do vídeo autorizado, a gravação revela que a execução decorreu de forma agitada, com várias das testemunhas a insultarem o antigo ditador iraquiano, gritando o nome do líder radical xiita, Moqtada al-Sadr, cujo pai foi mandado matar por Saddam. Aparentando alguma calma, o antigo Presidente iraquiano responde: 'É isto que vocês consideram humanismo'?".

A pergunta de Saddam é pertinente. Sejam quais forem as circunstâncias, os insultos não são admissíveis, muito menos, ainda, no contexto de execução de uma pena que se diz ter sido imposta por um tribunal de um suposto Estado de Direito.

Ora, quem não tem respeito pelas suas regras, não tem respeito por si próprio e, por conseguinte, não é merecedor de respeito, ensinou-me a minha Mãe, que aprendeu com o meu Avô.

Acho que alguém devia lembrar este princípio básico da Justiça à "Administração Bush".

Mudanças - Mapa judiciário - parte I

Tem razão o Dr. Vítor Sequinho dos Santos, quando refere aqui que é imprescindível ler este post do Dr. Paulo Ramos de Faria.

Mudanças - Advocacia - parte I

Há uns tempos atrás encontrei aqui um estudo intitulado "Percursos da informalização e da desjudicialização – por caminhos da reforma da administração da justiça (análise comparada)", no qual é analisada a situação das várias profissões jurídicas e, designadamente, da advocacia.

Aí se refere que, para alguns autores, a advocacia europeia mudou mais nos últimos vinte anos do que nos últimos duzentos. Passo a transcrever:

"Sobre a crise dos advogados em França, Lucien Karpic (cfr. 1999:67) faz uma reflexão que sintetiza parte da discussão actual:
'A profissão de advogado duvida dela própria. Este sentimento colectivo de crise é paradoxal, pois nas últimas décadas a profissão mudou mais que nos dois séculos anteriores. Era uma profissão homogénea, organizada em torno de mercados específicos e dominados por uma lógica política, tendo-se transformado numa profissão marcada por uma forte diferenciação - a clientela alargou-se dos particulares às grandes empresas e as posturas simbólicas e materiais transformaram-se em interesses - com uma orientação em direcção ao mercado. (...)

Os advogados, como no caso francês (podendo adaptar-se à realidade portuguesa com algumas nuances), apoiaram tradicionalmente a sua estratégia profissional em quatro vectores principais (Karpic,1999:68):
1) a adopção de uma estratégia colectiva baseada no primado da política e que os levou a estarem nas lutas políticas contra o Estado, nos séculos XVIII e XIX, defendendo uma perspectiva liberal até se transformarem numa elite dirigente, facto que originou uma perda de prestígio e de influência pública, combatida pela tentativa de sacralização da profissão e da identidade profissional;
2) a demonstração pública de um compromisso político que recusava a acumulação capitalista e postergava a interdição do envolvimento dos advogados no mercado de negócios;
3) a assunção de uma prática jurídica onde o primado dos clientes particulares assumia uma importância determinante, apoiada nas competências jurídicas fundamentais ligadas aos direitos civil e penal clássicos;
4) e a construção de um poder profissional que percorreu um caminho glorioso, sustentado, coerente e, sobretudo, indispensável.
Hoje, em inícios do Século XXI, a situação alterou-se radicalmente, embora a acção dos advogados, mesmo que movida por interesses pessoais, se fazer com o recurso aos referidos princípios e ideiais".

(...)A tradição do advogado como profissional liberal está, cada vez mais, desactualizada. A prestação de serviços para empresas, entidades estatais, associações e mesmo para outros advogados é cada vez mais comum. A concentração de serviços jurídicos é cada vez maior, em especial através de médios e grandes escritórios que incorporam especialistas em várias áreas, permitindo ter um leque muito variado de serviços para oferecer.

Todas estas transformações revelam uma mudança estrutural na identidade dos advogados, registando-se essa transformação com maior profundidade entre as gerações mais novas. A perspectiva perante a profissão, a dispersão de interesses e a profusão de ideiais geram uma discrepância bastante grande, para além do aumento exponencial da concorrência dentro da profissão, fruto do aumento do número de advogados e das alterações verificadas na procura"
.

Não sei se a análise da situação francesa é assim tão aplicável à portuguesa como os autores do estudo querem fazer crer. Provavelmente será, mas creio que só daqui a mais algum tempo.

De qualquer forma, concordo que os mais afectados pelas transformações são os mais novos. E é a pensar neles que recomendo a leitura deste artigo publicado no último BOA, que aborda um aspecto das mudanças que mais os afecta, a saber, a "Relação Jurídica entre os Associados e as Sociedades de Advogados".

E, já agora, recomendo também a leitura do acórdão e da comunicação a que aí se alude, e bem assim das conclusões que sobre essa matéria foram aprovadas.

E também faço votos que em 2007 haja reflexão séria e profunda sobre esta questão, porque, como é bom de ver, o futuro vai passar por aqui.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança;
do mal ficam as mágoas na lembrança,
e do bem – se algum houve – as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
que já coberto foi de neve fria,
e enfim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto:
que não se muda já como soía.

Luis de Camões


Bom Ano.