Comentários "asnáticos" - aditamento

Uma vez que o comunicado do Presidente do Conselho Distrital do Porto foi retirado do site daquele órgão, aqui deixo nota que uma parte do mesmo ainda pode ser lida no blog Defensor Oficioso

Aqui deixo, igualmente, a versão integral desse texto, com excepção da identificação dos intervenientes, que retirei:

"O Conselho Superior da Magistratura e o “ARGUMENTO ASNÁTICO”

Comentário do Presidente do Conselho Distrital do Porto da
Ordem dos Advogados.

OS FACTOS:

Em resposta a requerimento do Senhor Advogado Dr...... , respondeu o Senhor Juiz de Direito do Tribunal de ........, Dr. ..........., nos seguintes termos:

“3. Apreciando e decidindo
....
3.6. No que se refere à invocada falta de aplicação analógica do artigo 796.º, n.º3 do CPC, salvo o devido respeito, tal argumento é asnático e completamente contrário ao preceito legal que regula a aplicação de normas entre formas processuais distintas, a saber, as regras do art.º 463.º e 464.º do CPC que dispõe precisamente num sentido inverso de aplicação, ou seja, as normas do processo ordinário são aplicáveis ao processo sumário ou sumaríssimo quando nestes haja omissão ou insuficiência e no que neles não estiver estabelecido, jamais tendo sido intenção do legislador aplicar o absolutamente oposto, isto é, as normas do processo sumaríssimo ao processo ordinário.”. (Sublinhado nosso)

Perante tal dislate, violador das mais elementares regras de urbanidade e correcção, requereu o Senhor Advogado certidão do referido despacho, com que instruiu participação feita ao Conselho Superior da Magistratura, aí entrada em ...., da mesma tendo dado conhecimento ao Conselho de Deontologia do Porto, que a remeteu ao Presidente do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados.

Face à gravidade dos factos, o Senhor Presidente deste Conselho Distrital, enviou, em ......, carta ao Senhor Presidente do Conselho Superior da Magistratura, nos seguintes termos:

“ Tendo tomado conhecimento, na qualidade de Presidente do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, de participação disciplinar que o Exmº. Senhor Advogado, Dr......., apresentou a esse Conselho Superior da Magistratura contra o Exmº. Magistrado Judicial Dr. ......., em ... de .... de ...., venho solicitar de V.Exª. me informe da situação actual da dita participação disciplinar, cujos factos reputo de muito graves e, na conjuntura actual, de absolutamente lamentáveis.
Permita Exmº. Senhor Juiz Presidente que daqui o cumprimente com consideração.”

Em ......, deu entrada neste Conselho Distrital, ofício assinado pelo Juiz Secretário do Conselho Superior da Magistratura, Senhor Dr. ......, capeando a deliberação do Conselho Permanente tomada em sessão de ......, que é do seguinte teor:

“ Decorrendo das explicações do Exmº. Juiz de Direito do ...., Dr. ........, que este não teve qualquer intenção de ofender a pessoa do Exmº Advogado, Dr. ........, e que reconhece que a adjectivação usada no despacho, referido a um argumento invocado pelo ilustre causídico, corresponde a um momento infeliz, que deveria ter evitado e de que se penitencia, de forma pesarosa (atitude que está de acordo com a personalidade coerente e respeitadora dos valores que devem pautar o exercício funcional de um Juiz), foi deliberado arquivar a participação contra o Exmº Juiz apresentada pelo Exmº Advogado acima identificado.
Mais foi deliberado enviar cópia da resposta do Exmº Juiz ao Exmº Advogado participante.”

Os factos acima descritos, mereceram o seguinte comentário do Exmº Senhor Presidente do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados:

“ Foi com estupefacção que tomei conhecimento da deliberação tomada na sessão do Conselho Superior da Magistratura, de ........

Mal vai a nossa Justiça quando se aceita, sem mais, que um Senhor Magistrado Judicial adjective de “asnático” um argumento jurídico usado por um Advogado no âmbito de um processo judicial.

E pior vai quando esse comportamento do Senhor Magistrado Judicial é “branqueado” pelo órgão máximo da Magistratura Portuguesa.

Estou em crer que este não é o caminho correcto para uma Justiça sã, verdadeira e credível.

Pense-se apenas no que sucederia se os Advogados, doravante, passassem a qualificar de ASNÁTICOS os argumentos jurídicos dos Senhores Magistrados usados nos respectivos despachos e sentenças.
Bastaria depois, no competente processo disciplinar instaurado, obviamente, ao Advogado em causa – ou até no processo criminal respectivo que teria com toda a certeza lugar - que este viesse penitenciar-se, de forma pesarosa e sofrida, do que afirmara e, sem sequer se ouvir o Senhor Magistrado ofendido, considerar-se-iam boas as explicações dadas pelo Advogado…e o processo, pura e simplesmente, seria arquivado.

A urbanidade, a educação e a responsabilidade por aquilo que cada um faz, nomeadamente por escrito, são factores fundamentais para o funcionamento de qualquer sistema judicial.

Foi, pois, com muita mágoa e muita apreensão que tomei conhecimento daquela deliberação, e, por isso mesmo, não quis deixar de partilhar com todos os Advogados esta minha indignação, aqui no «site» do CDPorto.”

Comentários "asnáticos"

O Presidente do Conselho Distrital do Porto da OA, através do site daquele órgão, veio tornar pública a sua estupefacção por ter tido conhecimento que o Conselho Superior da Magistratura decidiu, em Maio passado, arquivar a queixa apresentada por um advogado daquele Distrito contra um juiz, por este ter qualificado como "asnático" um argumento jurídico usado pelo queixoso numa peça processual (cfr. aqui )

Entende o Presidente do Conselho Distrital do Porto que "este não é o caminho correcto para uma Justiça sã, verdadeira e credível", acrescentando: "Pense-se apenas no que sucederia se os Advogados, doravante, passassem a qualificar de ASNÁTICOS os argumentos jurídicos dos Senhores Magistrados usados nos respectivos despachos e sentenças".

Recordei-me, então, que há uns tempos atrás o Bastonário da OA dizia ao DN que está em curso uma tentativa de "amestrar" e "amolecer" os advogados, pensando, certamente, no elevado número de participações disciplinares, apresentadas por magistrados contra os advogados, com fundamento no uso de expressões que reputam de violadoras do dever de urbanidade.

Por tudo isto, e com o devido respeito, - que é muito -, pela indignação do Presidente do Conselho Distrital do Porto, acho que se perdeu uma boa oportunidade de fazer algo verdadeiramente útil pelos advogados: se o Conselho Superior da Magistratura decidiu arquivar a queixa por não ter havido intenção de ofender, por parte do magistrado visado, então certamente não levaria a mal que todas as queixas deste tipo, apresentadas por magistrados contra os advogados, fossem arquivadas pelos Conselhos de Deontologia da OA, com o mesmo fundamento .

Lá diz o povo: "amor com amor se paga".

O Bastonário, os segredos e as fugas

Pergunta: "Pode dizer-se que na justiça o mais difícil tem sido guardar segredo?"
Resposta: "Não diria isso. O que há é segredos a mais. E quando há muitos segredos para guardar, é natural que haja mais fugas.(...)"

Ainda o Bastonário Rogério Alves à Revista "Pessoal" Site OA

Citação do dia

Pergunta: "Por que é que o segredo de justiça é violado?"
Resposta: "Porque há quem o viole."

Bastonário Rogério Alves à Revista "Pessoal", Julho de 2006 site OA

"Nuances"

O DN noticia que o Estado Português foi condenado pelo Comité dos Direitos do Homem da ONU a revogar as disposições da legislação interna que impedem um cidadão de apresentar em tribunal a sua própria defesa e o obrigam a fazer-se representar por advogado, por entender que tais disposições violam o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. http://dn.sapo.pt/2006/07/10/sociedade/onu_condena_estado_portugues.html

Diz a notícia que "aquele órgão condena Portugal por ter impedido que F..., economista e advogado, se defendesse a si próprio, tendo em conta a legislação nacional que obriga ainda a que todos os recursos sejam subscritos por um advogado. Para o comité, "um acusado que seja forçado a aceitar um advogado que não queira e em que não tenha confiança não terá capacidade para se defender eficazmente", pelo que o direito de assegurar a sua própria defesa "pode ser posto em causa caso um advogado seja nomeado oficiosamente para um acusado contra a sua vontade" (...).

Uma leitura mais atenta da notícia permite discernir que o economista/advogado em causa teria, à data em que os factos ocorreram, a inscrição na OA suspensa, o que significa que não estaria legalmente habilitado a exercer a profissão.

Está bem de ver que o Comité não se terá apercebido desta "nuance". Uma coisa é permitir a um advogado representar-se a si próprio em processo penal, outra, completamente diferente, aceitar que qualquer cidadão possa livremente fazer essa opção.

Depois, também não se descortina bem como é que a recusa do acusado em constituir advogado, pelo facto de pretender exercer o patrocínio em causa própria, pode levar à conclusão de que foi forçado a aceitar um advogado em quem não depositava confiança, o que terá prejudicado o seu direito de defesa.

Se outra virtude não tiver, esta decisão do CDH da ONU tem, pelo menos, o mérito de nos fazer apreciar mais os juízes portugueses...