"Quem é quem"

Quando as minhas Filhas eram pequenas eu jogava com elas um jogo intitulado "quem é quem". Perguntava: tem cabelo loiro ou castanho? tem óculos? tem bigode? até conseguir identificar a personagem que figurava na carta por elas escolhida. Era um jogo divertido.

Lembrei-me disto agora, quando li este postal do meu jovem (penso eu) Colega do Porto sobre este "anúncio" do Diário Económico.

Afirma o meu Colega "a sério: Esta oferta levanta-me sérias e legítimas dúvidas, porque é claramente mais um passo no caminho do estabelecer diferenças na profissão, que irão provocar à la longue cisões na Advocacia e por inerência na Ordem dos Advogados".

Ainda que me pareça que as "diferenças" em nada são determinadas por estas "ofertas", confesso que não me apetece, agora, contrariar tal opinião, e muito menos as "sérias e legítimas dúvidas" que a "oferta" suscita ao meu Colega.

Em vez disso prefiro transcrever um excerto de uma dissertação de um Ilustre Decano, igualmente do Porto, intitulada "O direito nas curvas da vida", que encontrei aqui .

Escreve o Decano:
"A época dos grandes advogados, dos chamados “ténors”, dos célebres “patrons”, está em vias de extinção. “Abogados de oro” (Rámon Tigeras) dos enormes escritórios de negócios, de influências, de lobbies e até de politicas ganham cada vez mais corpo na Europa.
Os tempos actuais não são de moderação mas, sim, de mudança, de viragem, de desafio, em que o futuro da advocacia é um processo radicalmente aberto e in-determinado em permanente movimento de auto-superação.
Bem sei (até porque algumas coisas tenho escrito sobre o tema) que os 'signos do nosso tempo' são os da 'crise do futuro'. Mas é preciso que nos libertemos de uma dupla ilusão que dominou a 'intelligentzia' desde há décadas: a nostalgia de um passado findo assim como a esperança de um futuro radioso.
É que se, ontem, tínhamos o direito de ser fatalistas por optimismo, doravante devemos ser audaciosos por pessimismo. Nesta consciência crítica perpassa um optimismo pessimista, corrijo, um pessimismo optimista (enganei-me de propósito), uma visão desoladora com um mínimo de esperança."


Apesar de "o inventário da minha bagagem" de 22 anos de profissão ser infinitamente menor, em todos os sentidos, que o proporcionado pelos "47 anos de ofício como advogado, a mais difícil e perigosa das profissões (Carnelutti)" que o nosso Decano já leva, acho que consigo entender o que ele afirma.

Talvez por isso, cada vez que folheio revistas como essa do "quem é quem" da advocacia, procuro aquela disposição que usava para disputar o jogo homónimo com as minhas Filhas: é louro ou moreno? tem bigode? é careca? Depois, arrumo-as na prateleira, e concentro-me nas tarefas que me fazem seguir em frente, pela via que eu escolhi.

Faz hoje um ano...

"Os heróis da nossa geração, à excepção do "Perry Mason", ou da "Ally McBeal", raramente se enquadram na figura de um advogado. Os exemplos que cultivamos na Universidade estão ligados ao direito mas só por vezes damos conta que sejam advogados, porque ali isso parece acidental.

Por isso mesmo, quando cheguei ao centro de estágios, em Outubro de 2003, tinha uma surpresa à minha espera com a qual não contava. Havia uma exposição fotográfica e documental que mostrava a insigne imagem do Dr.Salgado Zenha.

Manifestei-me interessado, conhecendo dele a fama de ter sido um homem notável, envolvido activamente na materialização do sonho democrático em Portugal, e antes de mais pensei para comigo próprio em que sentido se enquadrava ali, nas instalações do centro de estágios, uma exposição alusiva a ele.

Para minha perplexidade descobria pela primeira vez que aquela eminente figura da história do meu país tinha sido advogado. Senti-me satisfeito. E recordei a consciência do valor de um modelo. É um exemplo vivo, ou a sua memória, que está carregado/a de valores que devem ser apreendidos e que nos assegura que podem ser praticados. (...)

A exposição encontrava-se no rés do chão onde provisoriamente se encontrava uma máquina de café. Entretanto no 1º andar passar-se-ia algo ainda melhor. O que conto de seguida faço-o porque simplesmente tenho de o fazer.

Quando falo de exemplos, lembro-me do meu pai, para quem sempre olho para cima. Nesse dia, depois de um intervalo, assisti àquela que considero a melhor prelecção de Processo Civil enquanto jurista. Que faria corar qualquer professor universitário. E descobri um grande Homem , na figura de um, dizem modestamente, formador. Mas não é apenas um formador.

A pessoa de quem falo marcou-me no melhor dos sentidos, e quando me dirijo a ele é também para cima que olho. Estou a referir-me a outro grande exemplo para o qual eu hei-de viver a vida para agradecer e que se chama José Carlos Mira. Faço uma pequena homenagem que a sua entrega, competência, e dedicação muito merecem, e que vem tudo a propósito uma vez que falo de modelos."


Excerto do ensaio apresentado a concurso ao Prémio Bastonário Adelino da Palma Carlos 2004, intitulado "O sentido da Deontologia Profissional", da autoria de Filipe André Sanches, Advogado estagiário, e que pode ser lido, na íntegra, aqui

Parece que foi ontem, mas faz hoje, precisamente, um ano...

A Teologia e o Orgasmo

Li aqui que o Papa Bento XVI "solicitou, após a sua eleição no ano passado, um estudo teológico sobre o uso do preservativo. O resultado, um relatório de 200 páginas não tornado público que reflecte várias opiniões no seio da Igreja Católica, foi compilado pelo cardeal mexicano Javier Lozano Barragán, que dirige o departamento dos assuntos de saúde do Vaticano e que é considerado favorável a uma reforma neste aspecto. O relatório deverá agora ser estudado pela Congregação da Doutrina da Fé, que deverá redigir um novo documento e submetê-lo ao Papa."

Mudei de jornal, e fui encontrar aqui a notícia de que está agendado para o próximo dia 22 de Dezembro "o maior orgasmo do mundo". Ao que parece, a ideia é "injectar elevadíssimos níveis de energia positiva no campo magnético da terra" através de um orgasmo colectivo, com o objectivo de reduzir os níveis de violência no mundo. Os detalhes do evento podem ser encontrados aqui.

"Estudo teológico sobre o uso do preservativo" e "orgasmos colectivos" para reduzir o nível de violência no mundo.

O que é que uma coisa tem a ver com a outra? Nada, excepto o facto de ambas me parecerem igualmente absurdas.