O «admirável mundo novo» da formação profissional

A minha Colega Teresa Alves de Azevedo lembra aqui as mudanças ocorridas desde que, em finais de 1989, fez o estágio de advocacia. Apesar das diferenças que muito bem regista, o certo é que nessa altura vigorava já o EOA/84, ao abrigo do qual foi criado o actual modelo de formação. O anterior modelo, previsto no Estatuto Judiciário, assente no patrono tradicional, terminou em 1984, ano em que fiz o estágio.
A razão das alterações introduzidas pelo EOA/84 parecem-me evidentes: já nessa altura a formação ministrada pelo patrono tradicional era insuficiente, e quanto a isto a única alteração a registar relativamente aos tempos actuais foi ter-se agravado a insuficiência, por via das [más] condições de exercício profissional dos próprios patronos. Creio, no entanto, que o principal problema da formação não é esse, mas antes um outro, prévio e bem mais desestruturante: a progressiva destruição do antigo paradigma de Advogado. Exercer uma profissão - qualquer profissão - aprende-se, acima de tudo, através do exemplo de quem, por vivê-la todos os dias, vinte e quatro horas por dia, anos a fio,  dá por si com ela nos «ossos», como aqui, de forma lapidar, alguém que sabe bem o que isso é, explica.
Quando fiz o estágio, o paradigma de Advogado vigente, claramente maioritário, porventura até único, era encarnado por Bastonários como Ângelo D' Almeida Ribeiro e Adelino da Palma Carlos,  para citar apenas os já desaparecidos. Foram eles o meu paradigma. Que resta dele? Quem o segue ainda? Será do interesse dos cidadãos, do Estado de Direito, mantê-lo? Ou, pelo contrário, há que substituí-lo por outro, e que outro? E quem vai formar os advogados, à luz desse outro paradigma? Para quem estiver mesmo interessado em perceber, uma sugestão: veja este vídeo até ao fim. Depois, para ter uma ideia de algumas pistas, espreite aqui e ainda aqui e finalmente aqui. Capice?

Qual é a dúvida?

Li, algures, há muito tempo, já não lembro onde, que o advogado que se patrocina a si próprio tem por cliente um tolo e por advogado um néscio. O mesmo vale para o patrocínio dos interesses de todos aqueles que lhe sejam próximos - cônjuge, familiares, amigos - porque não é fácil ser-se rigoroso e objectivo, menos ainda independente e isento, quando se trata de defender alguém próximo de «fogo inimigo». Parece-me óbvio. E também me parece óbvio que a capacidade de influenciar o julgador fica prejudicada sempre que este conclui que está perante um advogado que se defende a si próprio, ou alguém de si muito próximo, precisamente porque nestas condições não é de esperar rigor, objectividade, independência e isenção no exercício do patrocínio. Daí que ao ler isto me apeteça perguntar, mas afinal, qual é a dúvida?