O supremo prémio (continuação)

Escrevi sobre ele aqui, em Agosto de 2006, quando recusou ir até Madrid para receber a «Fields Medal», que lhe foi atribuída por ter resolvido  a conjectura de Poincaré, cem anos depois de ter sido inventada. Na altura considerou a distinção irrelevante, e eu, tudo ponderado, acabei a concordar com ele. Agora, a fazer fé no que li aqui,  parece querer ir mais longe: está em vias de recusar um prémio de um milhão de dólares."Páre de me incomodar, estou a apanhar cogumelos", terá sido a resposta que, pelo telefone, deu a um jornalista. As opiniões dividem-se: será muito excêntrico ou está louco? Parece que nem uma coisa nem outra,  está apenas desgostoso, «eticamente desgostoso». Ou, pelo menos, foi o que concluíu a escritora e jornalista Sylvia Nasar, depois de o entrevistar, em 2006, por causa dos comentários que lhe ouviu a propósito do comportamento de alguns colegas matemáticos: "Não são as pessoas que quebram as normas éticas que são vistas como estranhas. São as pessoas como eu que ficam isoladas." Chama-se Grigory Perelman, tem 43 anos,  é um matemático russo, vive em S. Petersburgo e trabalha no Instituto Steklov. Ainda de acordo com a mesma notícia do Público, o director do Instituto terá afirmado, há dias, que Perelman tem "princípios morais bastante estranhos" e que "reage muito mal a pequenos pormenores que considera impróprios", designadamente - como se vê - prémios monetários de um milhão de dólares. De facto, se pensarmos que nos dias de hoje a regra entre «notáveis» de outras áreas, igualmente numéricas mas menos abstractas, é o percebimento de vencimentos disparatados e imorais, não admira que seja ele quem passa por louco...   

4 comentários:

Maria Josefa Paias disse...

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Grigory Perelman, como eu o entendo, meu amigo de isolamento!...
E à Nicolina muito obrigada por partilhar este modo de estar na vida.

Beijinho e bom fim-de-semana.

Nicolina Cabrita disse...

Obrigada, Maria Josefa.
Beijinho e b.f.s. para si também.

Carlos Pires disse...

Talvez ele tenha razão para estar desgostoso.
Mas o isolamento dele coloca um problema mais sério que a excentricidade e os fait-divers referidos pelos jornais: qualquer actividade intelectual, seja a matemática seja a filosofia, requer troca de ideias e debate livre e crítico com interlocutores informados; ao isolar-se ele deixa de ter esses interlocutores. Ou não?

Nicolina Cabrita disse...

Parece-me que no caso de pessoas como Perelman, que nasceram com um dom tão absolutamente fora do normal, há sempre, em maior ou menor grau, um certo isolamento. A este propósito, e numa conversa que tive há dias, chamaram-me a atenção para o facto de serem sempre individuais as contribuições para os grandes avanços científicos, ao nível das ciências mais abstractas. Este é um exemplo, mas a História das Ciências está repleta de casos idênticos, apesar de, nas universidades, existirem grandes grupos de investigação a trabalhar os mesmos problemas. A verdade é que o mais que estes grupos de investigação conseguem é comprovar uma teoria que foi, claramente, um feito do génio individual. Embora os meus conhecimentos nesta área sejam limitados (o que, aliás, não é o caso do meu interlocutor, que trabalha nestas áreas) o pouco que conheço leva-me a concordar com ele.
Quando ao isolamento do indivíduo, ao nível pessoal, as conclusões já poderão ser diferentes...
Estarei enganada?