O Imenso, para sempre, sem fim da Patrícia Lousinha enviou-me um amigável «dardo» e eu, ingrata, ainda não agradeci devidamente. Aqui fica, então, o meu obrigado. Uma ranzinza como eu, e ainda por cima tão sem graça, não merece! É muito melhor ler a Excelente Patrícia, porque ainda que o tema seja chato, ela tem um jeitinho para dizer as coisas que a boa disposição é garantida. Saravah, Patrícia da Maçã, Excelência!Um Imenso até sempre! :-)
Fancaria política
No Público de hoje, domingo, António Barreto escreve sobre os milagrosos resultados dos exames do ano lectivo de 2007/2008 assim: «Mais de 400 escolas que hoje exibem médias positivas em todos os exames nacionais encontravam-se há um ano na lista negra das negativas. Considerando as vinte disciplinas do secundário com mais inscritos, mais de 82 por cento das escolas têm agora médias positivas. A média nacional dos exames de Matemática, negativa há um ano, é agora de mais de 12 valores! Há um ano, apenas 200 escolas conseguiram média positiva a Matemática. Agora, são mais de mil! Mais de 90 por cento das escolas têm agora média positiva a Matemática. Há escolas com médias a Matemática de 18 valores! No conjunto das duas disciplinas, Matemática e Português, 97 por cento obtiveram média positiva! Nas oito disciplinas principais do secundário, a média positiva foi atingida por 87 por cento das escolas!». Todos sabemos, porém, que a realidade subjacente a tais níveis de sucesso é a que está exemplarmente descrita num artigo de Helena Matos, que encontrei aqui. Qual será, então, o interesse em manter esta farsa estatística? pergunto-me. A quem aproveita a divulgação destes números? Será que quem nos governa não tem noção do ridículo? Não tem, é o que concluo, depois de ver este vídeo e de ler este post.
Ditos e manias
Há uns dias atrás um velho Senhor advogado que eu conheço lembrou-me, em conversa, um antigo dito do foro, que reza assim: o bom advogado é aquele de cuja pessoa o juiz não se lembra, na hora de ditar a sentença, por só ter memória para os respectivos argumentos. Hoje resolvi «afixá-lo» [ao dito, claro] sob a forma de «post», para que eu própria nunca me esqueça, já que lembrá-lo é também a melhor maneira de garantir que nunca serei surpreendida por uma fotografia minha aqui.
Citações do dia
«A experiência alcançada pela execução do Despacho n.ºOA/PCS/2008-2010/1 , pelo qual se regulou o sistema de distribuição de processos, mostra a necessidade de proceder ao seu ajustamento. Tendo em vista descongestionar os sobrecarregados serviços da Secretaria do Conselho, que se encontram desguarnecidos de meios humanos e de condições condignas de trabalho, e a funcionarem ainda de acordo com uma lógica não compatível com a indispensável autonomia funcional do Conselho Superior e de modo a abranger também na lógica da distribuição os processos de laudo, procede-se à alteração do normativo respectivo.(...)» Lisboa, 29 de Outubro de 2008. José António Barreiros [Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados]
(...)« O Bastonário salientou, na apresentação da Colectânea de Jurisprudência do Conselho Superior de 2005 a 2007 [ontem, dia 30.10.2008], a preocupação do actual Conselho Geral pela dignificação, respeito e prestígio dos órgãos disciplinares da Ordem dos Advogados. Manifestou também o seu empenho e do Conselho Geral em ajudar os órgãos disciplinares no cumprimento da sua espinhosa, dificil e ingrata missão.(...)»
(...)« O Bastonário salientou, na apresentação da Colectânea de Jurisprudência do Conselho Superior de 2005 a 2007 [ontem, dia 30.10.2008], a preocupação do actual Conselho Geral pela dignificação, respeito e prestígio dos órgãos disciplinares da Ordem dos Advogados. Manifestou também o seu empenho e do Conselho Geral em ajudar os órgãos disciplinares no cumprimento da sua espinhosa, dificil e ingrata missão.(...)»
Entendimentos vesgos
Ontem fui ao CCB ouvir o prof. João Lobo Antunes recordar o escritor José Cardoso Pires, numa conferência sobre “Memória e auto-ficção”. Por causa dele acabei por comprar e ler, ontem mesmo, de uma penada, o «De Profundis, Valsa lenta», do escritor homenageado, e o prefácio que o conferencista escreveu para essa obra. Do escritor conheço pouco, confesso, mas do autor do prefácio leio tudo o que apanho, ensaios, artigos, mesmo aqueles sobre uma Deontologia que, não sendo a minha, é a da profissão que em tempos sonhei exercer antes de descobrir o que era um tribunal. Foi aí - no prefácio - que a propósito da doença que atingiu o escritor, encontrei um comentário ao treino da prática médica, que não resisto a citar aqui. Afirma, na pág.8: «(...) é também popular auscultarem-se manequins (de borracha, entenda-se), simular situações patológicas com actores treinados para o efeito, e outras invenções pedagógicas que permitem ao aluno aprender sem tocar em doentes de carne e osso, tudo isto, a meu ver, por um entendimento vesgo de como se deve ensinar o ofício hipocrático. É claro que assim é impossível os aprendizes conhecerem o estado único de "humanidade ferida", no fundo a essência de qualquer moléstia». Sem tirar nem pôr o que eu penso sobre certas decisões de afastar do patrocínio de casos reais os aprendizes do meu ofício, porque sei que é da essência de ambos os ofícios o tratamento da "humanidade ferida", não obstante a diferente natureza das moléstias.
«Elogio da sinceridade»
Charles-Louis de Secondat, barão de Montesquieu, é lembrado até aos nossos dias por ser o autor do princípio da separação dos poderes, ideia matricial dos Estados modernos, contida no livro «De l'esprit des lois», publicado, anonimamente, em Genebra, no ano de 1748. Aristocrata por nascimento e juiz de profissão, Montesquieu escreveu, além daquela obra maior da ciência política, vários discursos, entre 1717 e 1721, um dos quais intitulado «Éloge de la sincérité», uma virtude «que faz na vida privada o homem de bem e no comércio dos grandes, o herói». Escreveu Montesquieu: «Aqueles cujo coração se corrompeu desprezam os homens sinceros, porque estes raramente acedem às honras e às dignidades; como se houvesse mais bela ocupação que dizer a verdade; como se o que faz com que se faça bom uso das dignidades não fosse superior às dignidades mesmas. Com efeito, a própria sinceridade tem tanto brilho como quando transportada à corte dos príncipes, o centro das honras e da glória. Pode dizer-se que é a coroa de Ariadne que é colocada no céu. É aí que esta virtude brilha com os nomes de magnanimidade, de firmeza, de coragem; e, como as plantas têm mais força quando crescem em terras férteis, assim a sinceridade é mais admirável junto dos grandes, onde a magestade mesma do Príncipe, que empalidece tudo o que a rodeia, lhe dá um novo brilho. Um homem sincero na corte de um príncipe é um homem livre entre escravos. Ainda que respeite o Soberano, a verdade, na sua boca, é sempre soberana, e, enquanto uma turba de cortesãos é joguete dos ventos que reinam e das tempestades que troam em redor do trono, ele é firme e inabalável, porque se apoia na verdade, que é imortal pela sua natureza e incorruptível pela sua essência. É, por assim dizer, garante perante os povos das acções do Príncipe». [ed. Fenda, 2005, pág.21 e 22].
Há quem de Montesquieu só tenha lido o tratado político, para daí retirar as grandes ideias. É pena. Muitas vezes as maiores verdades encontram-se nas obras pequenas.
Há quem de Montesquieu só tenha lido o tratado político, para daí retirar as grandes ideias. É pena. Muitas vezes as maiores verdades encontram-se nas obras pequenas.
Citação do dia
«Não tenhas acerca das coisas a opinião do indivíduo que te afronta, ou aquela que ele pretende que tu tenhas: encara-as, sim, como elas são na realidade.»
Marco Aurélio
Marco Aurélio
Globalização ou desintegração? (adit. I)
Nesta «weird» economia de mercado em que vivemos, na qual bancos e seguradoras privados são nacionalizados para evitar a falência [ou insolvência, como agora se diz], a bancarrota [palavra bem mais expressiva] chegou aos Estados, e começou pelo da Islândia. Cada vez que passo os olhos pelos jornais e encontro alusões aos efeitos da crise financeira, como por exemplo hoje aconteceu aqui, vem-me à memória um post que escrevi em Janeiro de 2007 a propósito de um livro intitulado «The Fall of Rome and The End of Civilization», que na altura li e me impressionou. Conforme, então, referi, o autor desse livro, Bryan Ward-Perkins, em entrevista concedida no início de 2006, apontou como causas para a dita «queda» do Império Romano duas crises militares: a invasão germânica, que acabou com a deposição do último imperador romano, em 476 d.c., primeiro, e as invasões árabes, que foram o golpe final, dois séculos depois. Ambas as crises destruiram as redes de produção e distribuição, técnicas perderam-se, o saber e o «saber fazer» regrediu. Foi, portanto, a «globalização» em que o império assentava que acabou por destrui-lo e, com ele, o bem estar de então. A História repete-se? É o que veremos.
o mundo está «weird»
No Museu da Ciência, em Lisboa, junto ao Pêndulo de Foucault, o antigo CEO do maior banco privado do país, agora editor e poeta, lançou o seu novo livro de poesias, intitulado «LXXXI Poema Teorema». Li aqui que o professor universitário, convidado a falar sobre os 99 poemas, achou o "livro estranho", na medida em que "a maior parte das coisas não são formalmente poesia". Quando, depois, passei os olhos sobre as outras notícias do dia, ocorreu-me que o livro do banqueiro não é a única realidade estranha. Cá para mim isto também não é capitalismo. Mas o que é mesmo «weird» é a sensação que me ficou de que entre estes dois factos deve haver alguma relação...
Dilemas existenciais
"Olívia Patroa e Olívia Costureira" é um hilariante monólogo que me lembro de ter visto há uns anos atrás, na RTP, no qual a saudosa Ivone Silva discorria sobre o dilema em que vivia a empregada/patroa Olívia, compelida a sanear-se a si própria. Estranhamente, foi esse monólogo que me veio à memória quando li aqui que o bastonário Rogério Alves «afirmou que Ricardo Sá Fernandes o procurou a 23 de Janeiro "não como bastonário mas a título pessoal" para se aconselhar sobre a hipótese de denunciar a alegada tentativa de corrupção às autoridades, mas não lhe contou que patrocinava como advogado a acção popular de José Sá Fernandes». Pergunto eu: se o bastonário pretende não ter sido ouvido como bastonário, por que razão o advogado em causa lhe falaria sobre os seus patrocínios? :-)
Viver no presente
«Fosse a tua vida três mil anos e até mesmo dez mil, lembra-te sempre que ninguém perde outra vida que aquela que lhe tocou viver e que só se vive aquela que se perde. Assim a mais longa e a mais curta se equivalem. O presente é igual para todos, o que se perde é, por isso mesmo, igual, e o que se perde surge como a perda de um segundo. Com efeito, não é o passado ou o futuro que perdemos; como poderia alguém arrebatar-nos o que não temos? Por isso toma sentido, a toda a hora, nestas duas coisas: primeiramente, que tudo, desde toda a eternidade, apresenta aspecto idêntico e passa pelos mesmos ciclos, e pouco importa assistir ao mesmo espectáculo em duzentos anos ou toda a eternidade; depois, que tanto perde o homem que morre carregado de anos como o que conta breves dias, consistindo a perda no momento presente; não se pode perder o que não se tem.»
Marco Aurélio
Voto SIMPLEX? Isso... é outra história :-)
O deputado José Lello descobriu, agora, que o voto por correspondência, usado nas eleições há mais de trinta anos, tem "muitas imperfeições" e pode ser "potencialmente permeável à fraude". Sendo o PS um partido tão preocupado em pôr o país a usar as novas tecnologias, pensei que viria aí o voto electrónico, mas o deputado diz que «o relatório da Comissão Nacional de Protecção de Dados "é bem elucidativo quanto à permeabilidade dos sistemas informáticos a intrusões abusivas e às imensas dificuldades que um tal sistema apresenta para garantir a fiabilidade de um acto eleitoral"» e por conseguinte, os emigrantes ou votam nos consulados ou então... não votam. Estranha opção quando se pensa que foi este governo quem inventou uma forma SIMPLEX de casar, divorciar, registar os filhos, comprar casar, constituir uma empresa, modificá-la e dissolvê-la, declarar rendimentos, apresentar participações criminais e eu sei lá que mais. Estou cá desconfiada que o deputado Lello não anda atento aos filmes de propaganda do governo do partido dele.
Os novos «Robins»
«Gang armado assalta balcão de Finanças», lê-se hoje, no Correio da Manhã. Depois de um Verão cheio de publicidade negativa, parece que os encapuzados decidiram responder ao preocupado apelo de Augusto Cymbrom, presidente da Associação Nacional dos Revendedores de Combustíveis (ANAREC), e optaram por uma vítima odiada pela generalidade dos cidadãos e bem mais lucrativa: o Fisco! Lindo...
As opções do ministro
O Ministro da Justiça diz que «prender menos foi uma opção política». A natureza da opção já todos tinhamos percebido, o problema é saber se, no actual contexto, esta terá sido uma boa opção. Pelo que leio, quando se fala na reforma penal as opiniões dividem-se entre a «benção» e a «lástima», o que por si só já é mau. Parece-me que uma lei só é «boa» se for consensual. Depois, há notícias que, a serem verdadeiras, levantam sérias dúvidas sobre a «bondade» da reforma, como por exemplo esta aqui, através da qual ficamos a saber que um meliante habitual, libertado na sequência das alterações introduzidas no Código Penal, foi detido após uma sequência de novos crimes, praticados, desta vez, com arma de fogo, para depois voltar a ser libertado, ao abrigo da nova lei, com um «TIR», que é a mesmíssima medida de coacção que lhe teria sido aplicada caso o dito meliante tivesse escolhido uma actividade criminosa menos interessante como, por ex., furtar cervejas e batatas fritas num qualquer hipermercado. A desproporção entre a gravidade dos crimes parece-me evidente, o facto do meliante ter passado a usar arma de fogo depois da reforma, preocupante. Perdoará o Ministro, perdoarão os Colegas, ademais Ilustres, mas eu estou como o outro: «something is rotten...»
9/11
David Sylvian [Nine Horses] - «Wonderful World»
It's a wonderful world
And you take and you give
And the sun fills the sky
In the space where you live
It's a day full of dreams
It's a dream of a day
And the joy that it brings
Nearly sweeps her away
It's a wonderful world
As the buildings fall down
And you quicken your step
‘til your feet leave the ground
And you're soaring above
All the sorrow below
And you're falling in love
With those you don't know
And your heart feels so wide
And your heart fills so strong
It was never a place
That you felt you belonged
It's a wonderful world
Full of wonderful things
And the people fall down
And abandon their dreams
(I hear him, he's talking out loud
Sometimes he whistles while walking
How could he know any better?
I weep for him, I weep for him now)
It's a wonderful world
It's a real crying shame
Cos she's hurting herself
In a violent way
And there's people she knows
That won't even try
And they're trapped in their lives
Feeling terrified
And it's in times like these
That she promised to call
But the scale of our love
Is diminished and small
It's a wonderful world
And she doesn't know why
She wakes up each day
And continues to cry
(He's sleeping his troubles away
He's finding it too hard to bear
I'm with him every step of the way
I weep for him, I weep for him now)
It's a wonderful world
And you take and you give
And the sun fills the sky
In the space where you live
Que neura!
Um dia inteiro sem sair de casa, com dores no corpo e pingo no nariz, pôs-me mais rabugenta que o habitual. Deve ser por isso que não achei graça alguma à notícia que o Estado cobrou aos notários uma taxa por um serviço que não prestou e agora se recusa a devolver o montante indevidamente cobrado, estimado entre 16 e 30 milhões de euros - uma ninharia!... Fiquei pior ainda quando percebi que, nas acções judiciais em que o Estado é parte, a regra é o ministério respectivo dar ordens no sentido de o Ministério Público recorrer das decisões em que é condenado, mesmo até em situações em que há nulas possibilidades de obtenção de ganho no tribunal superior e que «tal aconteceu não só com governos do PSD, mas também do PS». É que nos casos em que a parte é um mero cidadão, patrocinado por um mero advogado, se o primeiro quiser fazer o mesmo, o patrono arrisca-se a ser visado em processo disciplinar por violação do dever deontológico de «não promover diligências reconhecidamente dilatórias, inúteis ou prejudiciais para a correcta aplicação de lei (...)», previsto no art.º 85.º - 2 - a) do EOA. Ou seja, a actuação do Estado, enquanto parte, é o oposto do que exige aos cidadãos, enquanto legislador, o que é ainda mais vergonhoso quando a justificação que vem sendo dada, nos últimos anos, para dificultar o acesso aos tribunais superiores é, precisamente, a falta de fundamento dos recursos. Em suma, no que toca ao Estado português, não há ASAE que nos valha... Finalmente, a situação é ainda mais preocupante, quando olhamos à volta e percebemos que, um pouco por todo o lado estão a ser criados poderes novos, a exigir controlo, e a julgar pela amostra, são poucos os que reparam e apontam o dedo, como eu pensava ser suposto acontecer, quando existem instituições públicas a quem a lei confiou a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos - de todos em geral, entenda-se, porque há uns que até têm advogado constituído nos processos e, nestes casos, parece-me que o melhor mesmo é deixar essa incumbência para eles...
Intervalo... o programa segue dentro de momentos :-)
A pretexto do meu último aniversário - uma fatalidade, à qual não atribuo particular importância - recebi hoje uma prenda que me fez sorrir. É um marcador de livros azul celeste, que diz assim: «Todas as realizações começam com uma ideia... A persistência dá sempre recompensas... E a esperança ... Alegria...»
Serei, talvez, a última lunática sob este céu, mas há quem aprecie a minha companhia. Menos mal... :-)Obrigada, TAA.
Vale a pena recordar
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«(...) Existem três desvios típicos das ordens profissionais quanto às suas funções. Primeiro, há uma [a] tendência larvar para a defesa de posições malthusianas no acesso à profissão, que consiste no racionamento na entrada de novos profissionais. O que sucedeu em Portugal durante muitos anos, com as limitações à entrada nos cursos de Medicina, de resto ainda bem activas, há-de ficar na história como um “exemplo de escola”. A segunda tendência é a [b] ampliação desmesurada dos chamados “actos próprios” da profissão, de modo a expandir o exclusivo profissional, muitas vezes à custa das profissões confinantes. A terceira tendência consiste nas já referidas [c] restrições à concorrência, que aliás não se limitam à fixação de preços ou medidas afins.
O zelo das ordens na promoção dos interesses profissionais colectivos só tem paralelo no desmazelo ou desinteresse com que várias delas encaram as missões públicas de que estão encarregadas pelo Estado, nomeadamente o respeito pelos deveres deontológicos e das legis artis por parte dos seus membros.(...)»
[Vital Moreira em 20.6.2006, no Público]
O zelo das ordens na promoção dos interesses profissionais colectivos só tem paralelo no desmazelo ou desinteresse com que várias delas encaram as missões públicas de que estão encarregadas pelo Estado, nomeadamente o respeito pelos deveres deontológicos e das legis artis por parte dos seus membros.(...)»
[Vital Moreira em 20.6.2006, no Público]
pelos séculos das Ideias

«Pelos Séculos d'O SÉCULO» é o título de uma exposição organizada, em 2002, pelo Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo. Dessa exposição ficou um catálogo, que encontrei uns dois anos depois, numa Feira do Livro, arrumado entre um «bric à brac» de velharias em saldo. Ao vê-lo, esquecido no meio de livros velhos, lembrei-me da minha avó Nicolina, de ser criança e das muitas tardes que passei, sozinha, na arrecadação onde ela guardava pilhas de exemplares do «Século Ilustrado», a folhear revistas cheias de pó. Através do índice descobri um texto do meu então Presidente, João Pereira da Rosa, no qual ele recorda o Século e o avô, o carismático proprietário e director do jornal, cujo nome herdou, tal como eu herdei o nome da minha avó. Achei piada à coincidência - ou seja, à associação da memória do jornal aos nossos homónimos avós - e comprei o catálogo. Depois li o texto, no qual ele se propõe falar do «meu Século. Com parcialidade, sem o menor sentido de rigor, sem preocupações de ordem histórica, apenas, pura e simplesmente, com paixão». Retive, em particular, este excerto:
O Século era uma ideia que morreu, pensei, ou será que não? Será possível manter viva uma ideia, da qual apenas resta um espólio de fotografias e publicações, tombado num Arquivo Nacional? Mais importante ainda: será possível evitar que uma instituição que é, muito mais que um edifício com pessoas, poderes e «penachos», uma ideia, fique reduzida a um espólio destinado a um museu?
Voltando a um passado mais recente, volto a citar, uma vez mais, agora de memória, o meu antigo Presidente João Pereira da Rosa, a propósito do primeiro triénio do Conselho de Deontologia de Lisboa, sobre o funcionamento de um órgão eleito pelo método de Hondt: «qualquer homem é capaz de ganhar umas eleições; mas, para as saber perder é preciso ser-se um grande Senhor». Referia-se - como expressamente declarou - ao candidato por ele «derrotado», o nosso Vice Renato Ivo da Silva, que ele - o «ganhador» - quis que fosse o primeiro dos Vices, procurando garantir, desde o início do mandato, a coesão entre os membros do órgão, eleitos em listas concorrentes, sabendo que tal era essencial para o bom funcionamento do colectivo, ciente que a a Ordem é/deverá ser, antes de mais e acima de tudo, uma ideia comum a todos os Advogados. Esta é a minha convicção. Não tenho qualquer dúvida que é, também, a dele.

O Século era uma ideia que morreu, pensei, ou será que não? Será possível manter viva uma ideia, da qual apenas resta um espólio de fotografias e publicações, tombado num Arquivo Nacional? Mais importante ainda: será possível evitar que uma instituição que é, muito mais que um edifício com pessoas, poderes e «penachos», uma ideia, fique reduzida a um espólio destinado a um museu?
Voltando a um passado mais recente, volto a citar, uma vez mais, agora de memória, o meu antigo Presidente João Pereira da Rosa, a propósito do primeiro triénio do Conselho de Deontologia de Lisboa, sobre o funcionamento de um órgão eleito pelo método de Hondt: «qualquer homem é capaz de ganhar umas eleições; mas, para as saber perder é preciso ser-se um grande Senhor». Referia-se - como expressamente declarou - ao candidato por ele «derrotado», o nosso Vice Renato Ivo da Silva, que ele - o «ganhador» - quis que fosse o primeiro dos Vices, procurando garantir, desde o início do mandato, a coesão entre os membros do órgão, eleitos em listas concorrentes, sabendo que tal era essencial para o bom funcionamento do colectivo, ciente que a a Ordem é/deverá ser, antes de mais e acima de tudo, uma ideia comum a todos os Advogados. Esta é a minha convicção. Não tenho qualquer dúvida que é, também, a dele.
«Outros agentes»?!...
É sabido que só em 1984 foi publicado o primeiro diploma legal dedicado, exclusivamente, aos advogados e à sua Ordem profissional, o Decreto Lei n.º 84/84 de 16 de Março. Até essa data, as regras legais sobre a advocacia encontravam-se no velho Estatuto Judiciário [Decreto n.º 44278 de 14 de Abril de 1962] que, conforme se diz no preâmbulo do primeiro diploma, "no que se refere ao mandato judicial revelava uma manifesta inadequação à realidade presente (...)".
Dispunha o art.º 535.º do Estatuto Judiciário que o mandato judicial só podia ser conferido a «advogados, candidatos à advocacia, inscritos na Ordem e solicitadores». No EOA/84, esta regra passou a ter a seguinte redacção: « Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão e, designadamente, exercer o mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada» (cfr. art.º 53.º - 1 do EOA/84).
Em anotação a este art.º 53.º escreveu Alfredo Gaspar [«Estatuto da Ordem dos Advogados (e legislação complementar)», Jornal do Fundão, 1985] : «A designação de advogado - (...) - está generalizada, quer na lei, quer na linguagem comum; já a designação de advogado estagiário vem substituir, e com vantagem, a anterior expressão "candidato à advocacia" (cfr. art.º 550.º a 554.º do E.J.)». A ideia subjacente a esta anotação sempre me pareceu óbvia: o advogado estagiário é um advogado, ainda que as suas competências estejam limitadas pelo disposto no art.º 164.º do mesmo EOA e por isso «as disposições deste Estatuto, com as necessárias adaptações» sempre lhe foram aplicáveis, «excepção feita às que se referem a(o) exercício de direito de voto» (cfr. art.º 159.º - 1 do EOA/84).
Esta ideia que o advogado estagiário é um advogado foi, a meu ver, reforçada no EOA vigente - Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro - de duas formas: em primeiro lugar, através da substituição da expressão "advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor", que constava do art.º 53.º-1 do EOA/84, pela expressão "licenciados em Direito com inscrição em vigor" do actual art.º 61.º - 1 do EOA/05, cuja redacção passou, assim, a corresponder ao disposto no art.º 1.º de ambos os diplomas [«Denomina-se Ordem dos Advogados a associação pública representativa dos licenciados em Direito que, em conformidade com os preceitos deste Estatuto e demais disposições legais aplicáveis, exercem a advocacia», ao qual o EOA/05 apenas aditou o «profissionalmente»]; em segundo lugar, determinando que «obtida a cédula profissional como advogado estagiário» - ou seja, após a aprovação nas «provas de aferição» - o advogado estagiário pode exercer, com autonomia, a profissão, ainda que sob a orientação do patrono (cfr. art.ºs 188.º - 3 e 189.º do EOA/05).
Vem isto a propósito de ter lido aqui que «na Constituição o patrocínio forense é missão própria do advogados e não de outros agentes, incluindo os estagiários de advocacia». Fez-me pensar que comentário tal afirmação suscitaria ao meu querido e saudoso Presidente do Conselho Distrital de Lisboa, Alfredo Gaspar, que conheci era ainda estagiária e que sempre me tratou por «querida Colega». Em honra e memória dele, aqui fica registada a minha lembrança, na esperança que outros recordem o que eu não esqueci. Bem haja, meu Presidente Alfredo Gaspar!
Dispunha o art.º 535.º do Estatuto Judiciário que o mandato judicial só podia ser conferido a «advogados, candidatos à advocacia, inscritos na Ordem e solicitadores». No EOA/84, esta regra passou a ter a seguinte redacção: « Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão e, designadamente, exercer o mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada» (cfr. art.º 53.º - 1 do EOA/84).
Em anotação a este art.º 53.º escreveu Alfredo Gaspar [«Estatuto da Ordem dos Advogados (e legislação complementar)», Jornal do Fundão, 1985] : «A designação de advogado - (...) - está generalizada, quer na lei, quer na linguagem comum; já a designação de advogado estagiário vem substituir, e com vantagem, a anterior expressão "candidato à advocacia" (cfr. art.º 550.º a 554.º do E.J.)». A ideia subjacente a esta anotação sempre me pareceu óbvia: o advogado estagiário é um advogado, ainda que as suas competências estejam limitadas pelo disposto no art.º 164.º do mesmo EOA e por isso «as disposições deste Estatuto, com as necessárias adaptações» sempre lhe foram aplicáveis, «excepção feita às que se referem a(o) exercício de direito de voto» (cfr. art.º 159.º - 1 do EOA/84).
Esta ideia que o advogado estagiário é um advogado foi, a meu ver, reforçada no EOA vigente - Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro - de duas formas: em primeiro lugar, através da substituição da expressão "advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor", que constava do art.º 53.º-1 do EOA/84, pela expressão "licenciados em Direito com inscrição em vigor" do actual art.º 61.º - 1 do EOA/05, cuja redacção passou, assim, a corresponder ao disposto no art.º 1.º de ambos os diplomas [«Denomina-se Ordem dos Advogados a associação pública representativa dos licenciados em Direito que, em conformidade com os preceitos deste Estatuto e demais disposições legais aplicáveis, exercem a advocacia», ao qual o EOA/05 apenas aditou o «profissionalmente»]; em segundo lugar, determinando que «obtida a cédula profissional como advogado estagiário» - ou seja, após a aprovação nas «provas de aferição» - o advogado estagiário pode exercer, com autonomia, a profissão, ainda que sob a orientação do patrono (cfr. art.ºs 188.º - 3 e 189.º do EOA/05).
Vem isto a propósito de ter lido aqui que «na Constituição o patrocínio forense é missão própria do advogados e não de outros agentes, incluindo os estagiários de advocacia». Fez-me pensar que comentário tal afirmação suscitaria ao meu querido e saudoso Presidente do Conselho Distrital de Lisboa, Alfredo Gaspar, que conheci era ainda estagiária e que sempre me tratou por «querida Colega». Em honra e memória dele, aqui fica registada a minha lembrança, na esperança que outros recordem o que eu não esqueci. Bem haja, meu Presidente Alfredo Gaspar!
«O» prefácio

Começa assim o prefácio, escrito por António Sérgio:
«Eis-nos no limiar de uma nova Idade, nos momentos aurorais de uma revolução profunda. Mas, revolução de que espécie? Revolução com que intuitos? Com o objectivo de construir uma sociedade justa; com o de fazer-nos transitar da escravidão actual às necessidades imperiosas da vida física - para a assegurada liberdade em relação a elas; com o de lançar os alicerces de uma organização económica que nos permita prosperar sem competir com os demais, sem que um bem para um indivíduo seja um mal para outros; com o de erguer a estrutura de um regime social em que se torne possível a aplicação de um facto (e em todos os actos do nosso existir comum) das máximas de fraternidade e de amor do próximo, removendo os obstáculos à santificação das almas, desprendendo os indivíduos das preocupações pelo futuro, libertando-os do receio, assegurando a paz.
A empresa, porém, leva visos talvez de não poder ultimar-se sem esbarrar com resistências que a tornarão impura, por se lhe oporem os que crêem que perderão com ela; e é de temer que não poucos dos seus melhores servidores se vão deixando contaminar pelas paixões da luta, pela obsessão da violência, pela superstição da força; sobretudo que confundam certas condições da justiça (as da organização social, as do regime económico) com a justiça em si mesma e propriamente dita, que é um estado mental e uma disposição do íntimo, uma atitude da consciência, uma harmonização do espírito: e ocorreu-nos a ideia (que muitos capitularão de quimérica, absurdamente ingénua) de que alguns dos seduzidos por esse sonho humano se deveriam consagrar a realizar em si, e em torno de si, o ambiente moral para a sociedade nova, auxiliando a acção dos reformadores políticos por um trabalho modesto de apostolado puro: e como as atitudes morais que cada um adopta estão na estrita dependência de uma orientação filosófica, considerámos oportuna uma colecção de textos a que se desse com propriedade este sobretítulo comum: "manuais de iniciação na vida do espírito". Tal a interpresa que se enceta agora, com uma antologia dos pensamentos de Marco Aurélio» .
Li os primeiros parágrafos do prefácio e apaixonei-me pelo livro. Tenho andado com ele na mala, para ler nos «intervalos», rendida à quimera absurdamente ingénua que ele encerra, feliz por descobrir que antes de eu ser nascida existiram homens que assumiram o ridículo propósito de mudar o mundo. Faz-me sentir menos só, e tudo por uns míseros cinco euros.
«Eis-nos no limiar de uma nova Idade, nos momentos aurorais de uma revolução profunda. Mas, revolução de que espécie? Revolução com que intuitos? Com o objectivo de construir uma sociedade justa; com o de fazer-nos transitar da escravidão actual às necessidades imperiosas da vida física - para a assegurada liberdade em relação a elas; com o de lançar os alicerces de uma organização económica que nos permita prosperar sem competir com os demais, sem que um bem para um indivíduo seja um mal para outros; com o de erguer a estrutura de um regime social em que se torne possível a aplicação de um facto (e em todos os actos do nosso existir comum) das máximas de fraternidade e de amor do próximo, removendo os obstáculos à santificação das almas, desprendendo os indivíduos das preocupações pelo futuro, libertando-os do receio, assegurando a paz.
A empresa, porém, leva visos talvez de não poder ultimar-se sem esbarrar com resistências que a tornarão impura, por se lhe oporem os que crêem que perderão com ela; e é de temer que não poucos dos seus melhores servidores se vão deixando contaminar pelas paixões da luta, pela obsessão da violência, pela superstição da força; sobretudo que confundam certas condições da justiça (as da organização social, as do regime económico) com a justiça em si mesma e propriamente dita, que é um estado mental e uma disposição do íntimo, uma atitude da consciência, uma harmonização do espírito: e ocorreu-nos a ideia (que muitos capitularão de quimérica, absurdamente ingénua) de que alguns dos seduzidos por esse sonho humano se deveriam consagrar a realizar em si, e em torno de si, o ambiente moral para a sociedade nova, auxiliando a acção dos reformadores políticos por um trabalho modesto de apostolado puro: e como as atitudes morais que cada um adopta estão na estrita dependência de uma orientação filosófica, considerámos oportuna uma colecção de textos a que se desse com propriedade este sobretítulo comum: "manuais de iniciação na vida do espírito". Tal a interpresa que se enceta agora, com uma antologia dos pensamentos de Marco Aurélio» .
Li os primeiros parágrafos do prefácio e apaixonei-me pelo livro. Tenho andado com ele na mala, para ler nos «intervalos», rendida à quimera absurdamente ingénua que ele encerra, feliz por descobrir que antes de eu ser nascida existiram homens que assumiram o ridículo propósito de mudar o mundo. Faz-me sentir menos só, e tudo por uns míseros cinco euros.
Haja respeito!
Julgar a conduta de alguém, designadamente de um dos nossos pares, é uma actividade penosa, difícil, impõe a quem julga cuidado, escrúpulo, ponderação, reserva, contenção, impõe respeito por quem se queixa, respeito por quem é julgado, respeito pela própria função. Respeito.
Se hoje quebro o silêncio a que voluntariamente me remeti nos últimos tempos, saibam que é, também, por respeito.
Respeito pela estagiária que já fui, pelos extraordinários Advogados que nessa altura conheci e me tratavam como se eu fosse a advogada que ainda não era, e dessa forma me ensinavam a sê-lo, e assim me mostraram como se é merecedor de respeito. Recordo em particular, e com muita saudade, o meu Bastonário Ângelo d'Almeida Ribeiro, mas também o meu Bastonário Adelino da Palma Carlos, cujo escritório foi o primeiro escritório de advogados que pisei, o ambiente de fraterna camaradagem entre colegas de várias gerações que aí encontrei, e cuja memória guardarei até ao fim dos meus dias.
Se hoje quebro o silêncio a que voluntariamente me remeti nos últimos tempos, saibam que é, também, por respeito.
Respeito pela estagiária que já fui, pelos extraordinários Advogados que nessa altura conheci e me tratavam como se eu fosse a advogada que ainda não era, e dessa forma me ensinavam a sê-lo, e assim me mostraram como se é merecedor de respeito. Recordo em particular, e com muita saudade, o meu Bastonário Ângelo d'Almeida Ribeiro, mas também o meu Bastonário Adelino da Palma Carlos, cujo escritório foi o primeiro escritório de advogados que pisei, o ambiente de fraterna camaradagem entre colegas de várias gerações que aí encontrei, e cuja memória guardarei até ao fim dos meus dias.
Respeito pelas largas centenas de advogados estagiários que ao longo da minha vida ajudei a formar, alguns deles já com mais de uma década de exercício da profissão, que me ouviram com atenção, que aturaram os meus reparos, que se esforçaram por corresponder às minhas exigências e expectativas, que volta e meia encontro pelos tribunais, que me lembram tudo isto, de uma forma amiga, simpática, gentil.
Respeito por mim própria, que há um ano atrás senti necessidade de escrever isto, por respeito por todos aqueles jovens que, mau grado as enormes dificuldades, alimentam o sonho de, um dia, serem advogados e cuja realidade se encontra cruamente descrita aqui.
Para todos, a minha homenagem, o meu respeito.
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