Mais previsões

Primeiro foi o projecto da «loja da advocacia», agora uma associação que usa os media como meio alternativo de resolução de litígios . No futuro, quem sabe, talvez secretário de estado da justiça, quiçá ministro... :-)

«No Norte acontecem sempre coisas no último dia de aulas»

E a continuarem assim, um dia destes a directora regional de educação do Norte fica a saber pelo YouTube que os alunos usaram pistolas verdadeiras...

No pasó... :-)

Esta notícia que hoje encontrei no Correio da Manhã fez-me lembrar uma velha anedota sobre um galego, proprietário de uma tasca,  que em cada conta que fazia aditava uma parcela, que misteriosamente designava por si pasa. Sempre que um cliente mais curioso lhe perguntava o que era aquilo, o galego tirava o lápis da orelha,  riscava a dita parcela e murmurava um no pasó ...  

O magma grego

«Situação complicada e complexa, que corre o risco de se manter por muito tempo», ouvi, há minutos, do jornalista da RTP Paulo Dentinho, sobre a noite passada, no bairro Exarchia, em Atenas, deixando perceber a sua incapacidade para explicar a notícia. Fui «varrer» os jornais à procura de pistas, susceptíveis de tornar menos incompreensível a realidade subjacente à espantosa imagem de uma árvore de Natal a arder, frente ao edifício do Parlamento grego e encontrei-a nas palavras do demissionário reitor da Universidade de Atenas, citado pelo EL PAIS: «Há um divórcio entre a juventude e o sistema. Os programas políticos esqueceram-se deles, e o que agora peço aos partidos é que, de uma vez por todas, cheguem a acordo quanto a medidas que permitam salvar a educação e impedir que se acumule mais raiva. Quero acreditar que ainda vamos a tempo». Aí se fala, também, de «Ilias, de 21 anos, e de Irini, com 17, que são dois dos "milhares de anarquistas gregos" que ocupam o edifício da Universidade Politécnica de Atenas. (...) Ilias é técnico de electricidade e procura trabalho desde que terminou a formação profissional, há três anos atrás. Integra os 23% de gregos desempregados, a percentagem mais elevada da União Europeia. Irini estuda um ramo da Informática. "Tem mais saídas e não tens de pagar uma escola privada para aprender, como acontece na secundária". Ambos se queixam do abandono em que se encontra o sistema educativo. "Há jovens que ainda frequentam escolas instaladas em contentores desde o terramoto de 2006", afirma Elias. E pese embora o grande crescimento económico do país, caso encontrem trabalho, têm de contentar-se com um salário de 500 euros mensais. Quem consegue viver assim?". E ainda que fossem universitários, o salário não seria superior a 700 euros. Esta geração mal paga é o ingrediente principal de um "magma explosivo" - palavras do reitor ateniense - rápido a eclodir».
Agora entendo, olá se entendo! Basta lembrar-me das dezenas de currículos que me chegam pelo correio, cada vez que o fim de um ano lectivo se aproxima, jovens licenciados em Direito «implorando» estágio, ultimamente outros licenciados à procura de um lugar de administrativo, secretário, recepcionista. Jovens que, na sua esmagadora maioria, trabalham - quando trabalham - em condições de quase escravatura, mal pagos, em regime precário, os tais «200 mil trabalhadores a recibos verdes» que o Governo escolheu multar este Natal, sim, porque alguém vai ter de pagar estes «estímulos»...

Intervalo


«(...) em cada passo dessa linha
pode se machucar.
Azar!
a esperança é equilibrista
sabe que o show de todo o artista
tem de continuar...»
[Elis Regina, «O bêbado e a equilibrista»]



«Jingle bells, jingle bells...»

Na passada sexta feira uma multidão em fúria consumista atropelou mortalmente um empregado da loja da Wal-Mart, em Long Island, que estava no sítio errado à hora errada [cfr. aqui ]. Comentário de um colega:«It was crazy, the deals weren’t even that good». Não consta que a loja tenha sido encerrada após o infeliz acontecimento. Há mesmo notícia que, no dia seguinte, os consumidores, devidamente vigiados pela polícia, esperavam, em longas filas, a sua vez de entrar na loja. As autoridades estão a tentar entender o que se passou, mas admitem que não é certo que alguém venha a ser responsabilizado. Faz sentido. Deve ser por causa do espírito natalício...

Memórias da Caverna

A minha memória nunca foi grande coisa - fraccionada, selectiva, pouco rigorosa - e por isso nunca tive grande confiança nela. Habituei-me desde muito nova a não iniciar um raciocínio sem antes verificar a exactidão dos seus elementos, num procedimento semelhante àquele que os tripulantes de um avião usam antes de cada voo. Curiosamente, à medida que vou envelhecendo, tenho vindo a constatar que consigo lembrar-me de realidades, pensamentos, ideias, que permaneceram adormecidos nos meus neurónios durante anos, pelas razões mais bizarras e daí retiro um prazer estranho. Talvez esta seja a forma que a natureza encontrou de tornar menos penoso, quase aprasível, o inevitável envelhecimento. Vem isto a propósito do aplaudido discurso da minha Ilustre Colega Odete Santos, no XVIII Congresso do PCP, a decorrer no Campo Pequeno, e das memórias que me suscitou. A fazer fé no que os jornais transcrevem, a Dra. Odete Santos entende que impor o voto secreto nas votações internas dos partidos políticos é um «atentado» ao direito de expressão e de organização. Tempos houve em que o voto secreto era uma apostasia burguesa, um sinal de manobra contra revolucionária, uma marca das «forças» então designadas por «reacção». É verdade que nessa altura se falava em «ditadura do proletariado», expressão entretanto abolida do vocabulário revolucionário. Tempos longínquos esses, em que eu ouvia falar em «ditadura do proletariado» todos os dias, várias vezes ao dia, e simultâneamente lia, nos bancos do liceu, a «alegoria da caverna» de Platão, da qual hoje recordo, em particular, o seguinte excerto: «Supõe, então, como eles [os prisioneiros, obrigados a ver realidade através das sombras projectadas no fundo da caverna] reagiriam se fossem libertados das suas correntes e curados da sua ignorância e se as coisas se passassem assim: que se liberte um desses prisioneiros, que o forcem subitamente a erguer-se, a voltar o pescoço, a andar, a olhar para a luz; tudo isto o fará sofrer e, ofuscado pela claridade, não será capaz de olhar os objectos de que há pouco apenas via sombras. Pergunto-te: que poderá ele responder se lhe disserem que tudo quanto vira eram apenas vãs aparências, mas que agora, mais perto da realidade e voltado para objectos mais reais, ele vê de maneira mais certa? Se, por fim, lhe mostrassem cada um dos objectos, que desfilavam diante dele e o obrigassem, à força de perguntas, a dizer o que eram, não te parece que ficaria embaraçado e que as sombras que via antes lhe pareciam mais verdadeiras do que os objectos que lhe mostravam agora? (...) E se o forçassem a olhar a própria luz, não te parece que os seus olhos ficariam doridos e que se esquivaria e se voltaria para as coisas que podia olhar e lhes atribuiria maior realidade do que àquelas que lhe mostravam? (...) E se (...) o arrancassem da caverna e o fizessem subir a escarpada encosta e não o largassem senão depois de o terem arrastado para a luz do sol, ficaria deslumbrado pela claridade, incapaz de ver um só dos objectos que lhe apresentassem como verdadeiros?»

«Chegou a hora da verdade»

«É de lamentar que homens, com quem a revolução deveria contar, que tinham o dever de se encontrar lado a lado com outros revolucionários (...), não hesitem em estabelecer alianças de facto com os indignos que ontem combateram, só com o propósito de quererem impedir que as classes trabalhadoras tomem o seu destino em mãos(...). Chegou a hora da verdade para a Revolução portuguesa.(...)Agora que o fascismo, mercê das nossas hesitações, ambiguidades e querelas subalternas, está a levantar a cabeça (...), todos os antifascistas, todos os patriotas e todos os democratas(...)devem unir-se numa frente de defesa das liberdades democráticas,inabalável e indestrutível
Lembro-me de ouvir isto há 33 anos atrás, em directo, pela televisão, no Barreiro, o comício decorria ali mesmo ao lado, em Almada. Lembro-me do orador, descomposto, a pôr e a tirar os óculos, em frente a uma mole humana, que gritava palavras de ordem. Lembro-me de sentir uma estranha aflição, ouvindo aquele homem de cabeça perdida, pensando que alguém devia aconselhar o infeliz a descansar e tratar-se, porque aquele comportamento não era normal, o homem não podia estar bem, será que ninguém via? O tempo passou. Dizem que a História se repete, mas eu prefiro pensar que os homens aprendem e mudam.

Em final de mandato, um momento «zen» :-)

«“Arrependo-me de algumas coisas que não deveria ter dito”, afirmou o Presidente norte-americano [George W. Bush], quando questionado sobre os momentos menos positivos dos seus dois mandatos, apesar de admitir que a mulher, Laura, insistia em dizer-lhe que “como Presidente dos Estados Unidos devia ter cuidado com o que dizia”.» [Publico]


Citação do dia

« (...) Julgo que os advogados, quando vão para para presidentes da câmara ou outros cargos deste género deveriam suspender. Era necessária uma ruptura criadora» [ Bastonário da Ordem dos Advogados, em 1.11.2008, à revista Negócios & Lifestyle - Elite]

Tendo em consideração que «(...) São, designadamente, incompatíveis com o exercício da advocacia os seguintes cargos, funções e actividades: (...) presidentes de câmara municipal (...)» [cfr. art.º 77.º, n.º 1, alínea n.º a) do EOA/05 anteriormente vertido na art.º 69.º, n.º 1, alínea f) do EOA/84] é evidente que o Senhor Bastonário só podia estar a referir-se aos deputados. Não é de crer que um Bastonário ignore a existência de uma incompatibilidade que há mais de vinte anos consta do Estatuto da associação pública a que agora preside.

Os dardos da Patrícia :-)

O Imenso, para sempre, sem fim da Patrícia Lousinha enviou-me um amigável «dardo» e eu, ingrata, ainda não agradeci devidamente. Aqui fica, então, o meu obrigado. Uma ranzinza como eu, e ainda por cima tão sem graça, não merece! É muito melhor ler a Excelente Patrícia, porque ainda que o tema seja chato, ela tem um jeitinho para dizer as coisas que a boa disposição é garantida. Saravah, Patrícia da Maçã, Excelência!Um Imenso até sempre! :-)

Fancaria política

No Público de hoje, domingo, António Barreto escreve sobre os milagrosos resultados dos exames do ano lectivo de 2007/2008 assim: «Mais de 400 escolas que hoje exibem médias positivas em todos os exames nacionais encontravam-se há um ano na lista negra das negativas. Considerando as vinte disciplinas do secundário com mais inscritos, mais de 82 por cento das escolas têm agora médias positivas. A média nacional dos exames de Matemática, negativa há um ano, é agora de mais de 12 valores! Há um ano, apenas 200 escolas conseguiram média positiva a Matemática. Agora, são mais de mil! Mais de 90 por cento das escolas têm agora média positiva a Matemática. Há escolas com médias a Matemática de 18 valores! No conjunto das duas disciplinas, Matemática e Português, 97 por cento obtiveram média positiva! Nas oito disciplinas principais do secundário, a média positiva foi atingida por 87 por cento das escolas!». Todos sabemos, porém, que a realidade subjacente a tais níveis de sucesso é a que está exemplarmente descrita num artigo de Helena Matos, que encontrei aqui. Qual será, então, o interesse em manter esta farsa estatística? pergunto-me. A quem aproveita a divulgação destes números? Será que quem nos governa não tem noção do ridículo? Não tem, é o que concluo, depois de ver este vídeo e de ler este post.

Ditos e manias

Há uns dias atrás um velho Senhor advogado que eu conheço lembrou-me, em conversa, um antigo dito do foro, que reza assim: o bom advogado é aquele de cuja pessoa o juiz não se lembra, na hora de ditar a sentença, por só ter memória para os respectivos argumentos. Hoje resolvi «afixá-lo» [ao dito, claro] sob a forma de «post», para que eu própria nunca me esqueça, já que lembrá-lo é também a melhor maneira de garantir que nunca serei surpreendida por uma fotografia minha aqui.

Citações do dia

«A experiência alcançada pela execução do Despacho n.ºOA/PCS/2008-2010/1 , pelo qual se regulou o sistema de distribuição de processos, mostra a necessidade de proceder ao seu ajustamento. Tendo em vista descongestionar os sobrecarregados serviços da Secretaria do Conselho, que se encontram desguarnecidos de meios humanos e de condições condignas de trabalho, e a funcionarem ainda de acordo com uma lógica não compatível com a indispensável autonomia funcional do Conselho Superior e de modo a abranger também na lógica da distribuição os processos de laudo, procede-se à alteração do normativo respectivo.(...)» Lisboa, 29 de Outubro de 2008. José António Barreiros [Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados]

(...)« O Bastonário salientou, na apresentação da Colectânea de Jurisprudência do Conselho Superior de 2005 a 2007 [ontem, dia 30.10.2008], a preocupação do actual Conselho Geral pela dignificação, respeito e prestígio dos órgãos disciplinares da Ordem dos Advogados. Manifestou também o seu empenho e do Conselho Geral em ajudar os órgãos disciplinares no cumprimento da sua espinhosa, dificil e ingrata missão.(...)»

Entendimentos vesgos

Ontem fui ao CCB ouvir o prof. João Lobo Antunes recordar o escritor José Cardoso Pires, numa conferência sobre “Memória e auto-ficção”. Por causa dele acabei por comprar e ler, ontem mesmo, de uma penada, o «De Profundis, Valsa lenta», do escritor homenageado, e o prefácio que o conferencista escreveu para essa obra. Do escritor conheço pouco, confesso, mas do autor do prefácio leio tudo o que apanho, ensaios, artigos, mesmo aqueles sobre uma Deontologia que, não sendo a minha, é a da profissão que em tempos sonhei exercer antes de descobrir o que era um tribunal. Foi aí - no prefácio - que a propósito da doença que atingiu o escritor, encontrei um comentário ao treino da prática médica, que não resisto a citar aqui. Afirma, na pág.8: «(...) é também popular auscultarem-se manequins (de borracha, entenda-se), simular situações patológicas com actores treinados para o efeito, e outras invenções pedagógicas que permitem ao aluno aprender sem tocar em doentes de carne e osso, tudo isto, a meu ver, por um entendimento vesgo de como se deve ensinar o ofício hipocrático. É claro que assim é impossível os aprendizes conhecerem o estado único de "humanidade ferida", no fundo a essência de qualquer moléstia». Sem tirar nem pôr o que eu penso sobre certas decisões de afastar do patrocínio de casos reais os aprendizes do meu ofício, porque sei que é da essência de ambos os ofícios o tratamento da "humanidade ferida", não obstante a diferente natureza das moléstias.

«Elogio da sinceridade»

Charles-Louis de Secondat, barão de Montesquieu, é lembrado até aos nossos dias por ser o autor do princípio da separação dos poderes, ideia matricial dos Estados modernos, contida no livro «De l'esprit des lois», publicado, anonimamente, em Genebra, no ano de 1748. Aristocrata por nascimento e juiz de profissão, Montesquieu escreveu, além daquela obra maior da ciência política, vários discursos, entre 1717 e 1721, um dos quais intitulado «Éloge de la sincérité», uma virtude «que faz na vida privada o homem de bem e no comércio dos grandes, o herói». Escreveu Montesquieu: «Aqueles cujo coração se corrompeu desprezam os homens sinceros, porque estes raramente acedem às honras e às dignidades; como se houvesse mais bela ocupação que dizer a verdade; como se o que faz com que se faça bom uso das dignidades não fosse superior às dignidades mesmas. Com efeito, a própria sinceridade tem tanto brilho como quando transportada à corte dos príncipes, o centro das honras e da glória. Pode dizer-se que é a coroa de Ariadne que é colocada no céu. É aí que esta virtude brilha com os nomes de magnanimidade, de firmeza, de coragem; e, como as plantas têm mais força quando crescem em terras férteis, assim a sinceridade é mais admirável junto dos grandes, onde a magestade mesma do Príncipe, que empalidece tudo o que a rodeia, lhe dá um novo brilho. Um homem sincero na corte de um príncipe é um homem livre entre escravos. Ainda que respeite o Soberano, a verdade, na sua boca, é sempre soberana, e, enquanto uma turba de cortesãos é joguete dos ventos que reinam e das tempestades que troam em redor do trono, ele é firme e inabalável, porque se apoia na verdade, que é imortal pela sua natureza e incorruptível pela sua essência. É, por assim dizer, garante perante os povos das acções do Príncipe». [ed. Fenda, 2005, pág.21 e 22].
Há quem de Montesquieu só tenha lido o tratado político, para daí retirar as grandes ideias. É pena. Muitas vezes as maiores verdades encontram-se nas obras pequenas.

Citação do dia

«Não tenhas acerca das coisas a opinião do indivíduo que te afronta, ou aquela que ele pretende que tu tenhas: encara-as, sim, como elas são na realidade.»
Marco Aurélio

Globalização ou desintegração? (adit. I)

Nesta «weird» economia de mercado em que vivemos, na qual bancos e seguradoras privados são nacionalizados para evitar a falência [ou insolvência, como agora se diz], a bancarrota [palavra bem mais expressiva] chegou aos Estados, e começou pelo da Islândia. Cada vez que passo os olhos pelos jornais e encontro alusões aos efeitos da crise financeira, como por exemplo hoje aconteceu aqui, vem-me à memória um post que escrevi em Janeiro de 2007 a propósito de um livro intitulado «The Fall of Rome and The End of Civilization», que na altura li e me impressionou. Conforme, então, referi, o autor desse livro, Bryan Ward-Perkins, em entrevista concedida no início de 2006, apontou como causas para a dita «queda» do Império Romano duas crises militares: a invasão germânica, que acabou com a deposição do último imperador romano, em 476 d.c., primeiro, e as invasões árabes, que foram o golpe final, dois séculos depois. Ambas as crises destruiram as redes de produção e distribuição, técnicas perderam-se, o saber e o «saber fazer» regrediu. Foi, portanto, a «globalização» em que o império assentava que acabou por destrui-lo e, com ele, o bem estar de então. A História repete-se? É o que veremos.

o mundo está «weird»

No Museu da Ciência, em Lisboa, junto ao Pêndulo de Foucault, o antigo CEO do maior banco privado do país, agora editor e poeta, lançou o seu novo livro de poesias, intitulado «LXXXI Poema Teorema». Li aqui que o professor universitário, convidado a falar sobre os 99 poemas, achou o "livro estranho", na medida em que "a maior parte das coisas não são formalmente poesia". Quando, depois, passei os olhos sobre as outras notícias do dia, ocorreu-me que o livro do banqueiro não é a única realidade estranha. Cá para mim isto também não é capitalismo. Mas o que é mesmo «weird» é a sensação que me ficou de que entre estes dois factos deve haver alguma relação...

Dilemas existenciais

"Olívia Patroa e Olívia Costureira" é um hilariante monólogo que me lembro de ter visto há uns anos atrás, na RTP, no qual a saudosa Ivone Silva discorria sobre o dilema em que vivia a empregada/patroa Olívia, compelida a sanear-se a si própria. Estranhamente, foi esse monólogo que me veio à memória quando li aqui que o bastonário Rogério Alves «afirmou que Ricardo Sá Fernandes o procurou a 23 de Janeiro "não como bastonário mas a título pessoal" para se aconselhar sobre a hipótese de denunciar a alegada tentativa de corrupção às autoridades, mas não lhe contou que patrocinava como advogado a acção popular de José Sá Fernandes». Pergunto eu: se o bastonário pretende não ter sido ouvido como bastonário, por que razão o advogado em causa lhe falaria sobre os seus patrocínios? :-)

Viver no presente

«Fosse a tua vida três mil anos e até mesmo dez mil, lembra-te sempre que ninguém perde outra vida que aquela que lhe tocou viver e que só se vive aquela que se perde. Assim a mais longa e a mais curta se equivalem. O presente é igual para todos, o que se perde é, por isso mesmo, igual, e o que se perde surge como a perda de um segundo. Com efeito, não é o passado ou o futuro que perdemos; como poderia alguém arrebatar-nos o que não temos? Por isso toma sentido, a toda a hora, nestas duas coisas: primeiramente, que tudo, desde toda a eternidade, apresenta aspecto idêntico e passa pelos mesmos ciclos, e pouco importa assistir ao mesmo espectáculo em duzentos anos ou toda a eternidade; depois, que tanto perde o homem que morre carregado de anos como o que conta breves dias, consistindo a perda no momento presente; não se pode perder o que não se tem
Marco Aurélio

Voto SIMPLEX? Isso... é outra história :-)

O deputado José Lello descobriu, agora, que o voto por correspondência, usado nas eleições há mais de trinta anos, tem "muitas imperfeições" e pode ser "potencialmente permeável à fraude". Sendo o PS um partido tão preocupado em pôr o país a usar as novas tecnologias, pensei que viria aí o voto electrónico, mas o deputado diz que «o relatório da Comissão Nacional de Protecção de Dados "é bem elucidativo quanto à permeabilidade dos sistemas informáticos a intrusões abusivas e às imensas dificuldades que um tal sistema apresenta para garantir a fiabilidade de um acto eleitoral e por conseguinte, os emigrantes ou votam nos consulados ou então... não votam. Estranha opção quando se pensa que foi este governo quem inventou uma forma SIMPLEX de casar, divorciar, registar os filhos, comprar casar, constituir uma empresa, modificá-la e dissolvê-la, declarar rendimentos, apresentar participações criminais e eu sei lá que mais. Estou cá desconfiada que o deputado Lello não anda atento aos filmes de propaganda do governo do partido dele.

Os novos «Robins»

«Gang armado assalta balcão de Finanças», lê-se hoje, no Correio da Manhã. Depois de um Verão cheio de publicidade negativa, parece que os encapuzados decidiram responder ao preocupado apelo de Augusto Cymbrom, presidente da Associação Nacional dos Revendedores de Combustíveis (ANAREC), e optaram por uma vítima odiada pela generalidade dos cidadãos e bem mais lucrativa: o Fisco! Lindo...

As opções do ministro

O Ministro da Justiça diz que «prender menos foi uma opção política». A natureza da opção já todos tinhamos percebido, o problema é saber se, no actual contexto, esta terá sido uma boa opção. Pelo que leio, quando se fala na reforma penal as opiniões dividem-se entre a «benção» e a «lástima», o que por si só já é mau. Parece-me que uma lei só é «boa» se for consensual. Depois, há notícias que, a serem verdadeiras, levantam sérias dúvidas sobre a «bondade» da reforma, como por exemplo esta aqui, através da qual ficamos a saber que um meliante habitual, libertado na sequência das alterações introduzidas no Código Penal, foi detido após uma sequência de novos crimes, praticados, desta vez, com arma de fogo, para depois voltar a ser libertado, ao abrigo da nova lei, com um «TIR», que é a mesmíssima medida de coacção que lhe teria sido aplicada caso o dito meliante tivesse escolhido uma actividade criminosa menos interessante como, por ex., furtar cervejas e batatas fritas num qualquer hipermercado. A desproporção entre a gravidade dos crimes parece-me evidente, o facto do meliante ter passado a usar arma de fogo depois da reforma, preocupante. Perdoará o Ministro, perdoarão os Colegas, ademais Ilustres, mas eu estou como o outro: «something is rotten...»

9/11



David Sylvian [Nine Horses] - «Wonderful World»

It's a wonderful world
And you take and you give
And the sun fills the sky
In the space where you live

It's a day full of dreams
It's a dream of a day
And the joy that it brings
Nearly sweeps her away

It's a wonderful world
As the buildings fall down
And you quicken your step
‘til your feet leave the ground
And you're soaring above
All the sorrow below
And you're falling in love
With those you don't know

And your heart feels so wide
And your heart fills so strong
It was never a place
That you felt you belonged

It's a wonderful world
Full of wonderful things
And the people fall down
And abandon their dreams

(I hear him, he's talking out loud
Sometimes he whistles while walking
How could he know any better?
I weep for him, I weep for him now)

It's a wonderful world
It's a real crying shame
Cos she's hurting herself
In a violent way
And there's people she knows
That won't even try
And they're trapped in their lives
Feeling terrified
And it's in times like these
That she promised to call
But the scale of our love
Is diminished and small

It's a wonderful world
And she doesn't know why
She wakes up each day
And continues to cry

(He's sleeping his troubles away
He's finding it too hard to bear
I'm with him every step of the way
I weep for him, I weep for him now)

It's a wonderful world
And you take and you give
And the sun fills the sky
In the space where you live

Que neura!

Um dia inteiro sem sair de casa, com dores no corpo e pingo no nariz, pôs-me mais rabugenta que o habitual. Deve ser por isso que não achei graça alguma à notícia que o Estado cobrou aos notários uma taxa por um serviço que não prestou e agora se recusa a devolver o montante indevidamente cobrado, estimado entre 16 e 30 milhões de euros - uma ninharia!... Fiquei pior ainda quando percebi que, nas acções judiciais em que o Estado é parte, a regra é o ministério respectivo dar ordens no sentido de o Ministério Público recorrer das decisões em que é condenado, mesmo até em situações em que há nulas possibilidades de obtenção de ganho no tribunal superior e que «tal aconteceu não só com governos do PSD, mas também do PS». É que nos casos em que a parte é um mero cidadão, patrocinado por um mero advogado, se o primeiro quiser fazer o mesmo, o patrono arrisca-se a ser visado em processo disciplinar por violação do dever deontológico de «não promover diligências reconhecidamente dilatórias, inúteis ou prejudiciais para a correcta aplicação de lei (...)», previsto no art.º 85.º - 2 - a) do EOA. Ou seja, a actuação do Estado, enquanto parte, é o oposto do que exige aos cidadãos, enquanto legislador, o que é ainda mais vergonhoso quando a justificação que vem sendo dada, nos últimos anos, para dificultar o acesso aos tribunais superiores é, precisamente, a falta de fundamento dos recursos. Em suma, no que toca ao Estado português, não há ASAE que nos valha... Finalmente, a situação é ainda mais preocupante, quando olhamos à volta e percebemos que, um pouco por todo o lado estão a ser criados poderes novos, a exigir controlo, e a julgar pela amostra, são poucos os que reparam e apontam o dedo, como eu pensava ser suposto acontecer, quando existem instituições públicas a quem a lei confiou a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos - de todos em geral, entenda-se, porque há uns que até têm advogado constituído nos processos e, nestes casos, parece-me que o melhor mesmo é deixar essa incumbência para eles...

Intervalo... o programa segue dentro de momentos :-)

A pretexto do meu último aniversário - uma fatalidade, à qual não atribuo particular importância - recebi hoje uma prenda que me fez sorrir. É um marcador de livros azul celeste, que diz assim: «Todas as realizações começam com uma ideia... A persistência dá sempre recompensas... E a esperança ... Alegria...»
Serei, talvez, a última lunática sob este céu, mas há quem aprecie a minha companhia. Menos mal... :-)
Obrigada, TAA.

Vale a pena recordar


«(...) Existem três desvios típicos das ordens profissionais quanto às suas funções. Primeiro, há uma [a] tendência larvar para a defesa de posições malthusianas no acesso à profissão, que consiste no racionamento na entrada de novos profissionais. O que sucedeu em Portugal durante muitos anos, com as limitações à entrada nos cursos de Medicina, de resto ainda bem activas, há-de ficar na história como um “exemplo de escola”. A segunda tendência é a [b] ampliação desmesurada dos chamados “actos próprios” da profissão, de modo a expandir o exclusivo profissional, muitas vezes à custa das profissões confinantes. A terceira tendência consiste nas já referidas [c] restrições à concorrência, que aliás não se limitam à fixação de preços ou medidas afins.
O zelo das ordens na promoção dos interesses profissionais colectivos só tem paralelo no desmazelo ou desinteresse com que várias delas encaram as missões públicas de que estão encarregadas pelo Estado, nomeadamente o respeito pelos deveres deontológicos e das legis artis por parte dos seus membros.(...)»

[Vital Moreira em 20.6.2006, no Público]

pelos séculos das Ideias


«Pelos Séculos d'O SÉCULO» é o título de uma exposição organizada, em 2002, pelo Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo. Dessa exposição ficou um catálogo, que encontrei uns dois anos depois, numa Feira do Livro, arrumado entre um «bric à brac» de velharias em saldo. Ao vê-lo, esquecido no meio de livros velhos, lembrei-me da minha avó Nicolina, de ser criança e das muitas tardes que passei, sozinha, na arrecadação onde ela guardava pilhas de exemplares do «Século Ilustrado», a folhear revistas cheias de pó. Através do índice descobri um texto do meu então Presidente, João Pereira da Rosa, no qual ele recorda o Século e o avô, o carismático proprietário e director do jornal, cujo nome herdou, tal como eu herdei o nome da minha avó. Achei piada à coincidência - ou seja, à associação da memória do jornal aos nossos homónimos avós - e comprei o catálogo. Depois li o texto, no qual ele se propõe falar do «meu Século. Com parcialidade, sem o menor sentido de rigor, sem preocupações de ordem histórica, apenas, pura e simplesmente, com paixão». Retive, em particular, este excerto:







O Século era uma ideia que morreu, pensei, ou será que não? Será possível manter viva uma ideia, da qual apenas resta um espólio de fotografias e publicações, tombado num Arquivo Nacional? Mais importante ainda: será possível evitar que uma instituição que é, muito mais que um edifício com pessoas, poderes e «penachos», uma ideia, fique reduzida a um espólio destinado a um museu?

Voltando a um passado mais recente, volto a citar, uma vez mais, agora de memória, o meu antigo Presidente João Pereira da Rosa, a propósito do primeiro triénio do Conselho de Deontologia de Lisboa, sobre o funcionamento de um órgão eleito pelo método de Hondt: «qualquer homem é capaz de ganhar umas eleições; mas, para as saber perder é preciso ser-se um grande Senhor». Referia-se - como expressamente declarou - ao candidato por ele «derrotado», o nosso Vice Renato Ivo da Silva, que ele - o «ganhador» - quis que fosse o primeiro dos Vices, procurando garantir, desde o início do mandato, a coesão entre os membros do órgão, eleitos em listas concorrentes, sabendo que tal era essencial para o bom funcionamento do colectivo, ciente que a a Ordem é/deverá ser, antes de mais e acima de tudo, uma ideia comum a todos os Advogados. Esta é a minha convicção. Não tenho qualquer dúvida que é, também, a dele.

«Outros agentes»?!...

É sabido que só em 1984 foi publicado o primeiro diploma legal dedicado, exclusivamente, aos advogados e à sua Ordem profissional, o Decreto Lei n.º 84/84 de 16 de Março. Até essa data, as regras legais sobre a advocacia encontravam-se no velho Estatuto Judiciário [Decreto n.º 44278 de 14 de Abril de 1962] que, conforme se diz no preâmbulo do primeiro diploma, "no que se refere ao mandato judicial revelava uma manifesta inadequação à realidade presente (...)".

Dispunha o art.º 535.º do Estatuto Judiciário que o mandato judicial só podia ser conferido a «advogados, candidatos à advocacia, inscritos na Ordem e solicitadores». No EOA/84, esta regra passou a ter a seguinte redacção: « Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão e, designadamente, exercer o mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada» (cfr. art.º 53.º - 1 do EOA/84).

Em anotação a este art.º 53.º escreveu Alfredo Gaspar [«Estatuto da Ordem dos Advogados (e legislação complementar)», Jornal do Fundão, 1985] : «A designação de advogado - (...) - está generalizada, quer na lei, quer na linguagem comum; já a designação de advogado estagiário vem substituir, e com vantagem, a anterior expressão "candidato à advocacia" (cfr. art.º 550.º a 554.º do E.J.)». A ideia subjacente a esta anotação sempre me pareceu óbvia: o advogado estagiário é um advogado, ainda que as suas competências estejam limitadas pelo disposto no art.º 164.º do mesmo EOA e por isso «as disposições deste Estatuto, com as necessárias adaptações» sempre lhe foram aplicáveis, «excepção feita às que se referem a(o) exercício de direito de voto» (cfr. art.º 159.º - 1 do EOA/84).

Esta ideia que o advogado estagiário é um advogado foi, a meu ver, reforçada no EOA vigente - Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro - de duas formas: em primeiro lugar, através da substituição da expressão "advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor", que constava do art.º 53.º-1 do EOA/84, pela expressão "licenciados em Direito com inscrição em vigor" do actual art.º 61.º - 1 do EOA/05, cuja redacção passou, assim, a corresponder ao disposto no art.º 1.º de ambos os diplomas [«Denomina-se Ordem dos Advogados a associação pública representativa dos licenciados em Direito que, em conformidade com os preceitos deste Estatuto e demais disposições legais aplicáveis, exercem a advocacia», ao qual o EOA/05 apenas aditou o «profissionalmente»]; em segundo lugar, determinando que «obtida a cédula profissional como advogado estagiário» - ou seja, após a aprovação nas «provas de aferição» - o advogado estagiário pode exercer, com autonomia, a profissão, ainda que sob a orientação do patrono (cfr. art.ºs 188.º - 3 e 189.º do EOA/05).

Vem isto a propósito de ter lido aqui que «na Constituição o patrocínio forense é missão própria do advogados e não de outros agentes, incluindo os estagiários de advocacia». Fez-me pensar que comentário tal afirmação suscitaria ao meu querido e saudoso Presidente do Conselho Distrital de Lisboa, Alfredo Gaspar, que conheci era ainda estagiária e que sempre me tratou por «querida Colega». Em honra e memória dele, aqui fica registada a minha lembrança, na esperança que outros recordem o que eu não esqueci. Bem haja, meu Presidente Alfredo Gaspar!

«O» prefácio

Há uns dias atrás descobri, num alfarrabista de Campo de Ourique, este pequeno livro, editado em 1947, que contém excertos dos «Pensamentos» do imperador romano e filósofo estóico Marco Aurélio. Dei por ele cinco euros.

Começa assim o prefácio, escrito por António Sérgio:

«Eis-nos no limiar de uma nova Idade, nos momentos aurorais de uma revolução profunda. Mas, revolução de que espécie? Revolução com que intuitos? Com o objectivo de construir uma sociedade justa; com o de fazer-nos transitar da escravidão actual às necessidades imperiosas da vida física - para a assegurada liberdade em relação a elas; com o de lançar os alicerces de uma organização económica que nos permita prosperar sem competir com os demais, sem que um bem para um indivíduo seja um mal para outros; com o de erguer a estrutura de um regime social em que se torne possível a aplicação de um facto (e em todos os actos do nosso existir comum) das máximas de fraternidade e de amor do próximo, removendo os obstáculos à santificação das almas, desprendendo os indivíduos das preocupações pelo futuro, libertando-os do receio, assegurando a paz.

A empresa, porém, leva visos talvez de não poder ultimar-se sem esbarrar com resistências que a tornarão impura, por se lhe oporem os que crêem que perderão com ela; e é de temer que não poucos dos seus melhores servidores se vão deixando contaminar pelas paixões da luta, pela obsessão da violência, pela superstição da força; sobretudo que confundam certas condições da justiça (as da organização social, as do regime económico) com a justiça em si mesma e propriamente dita, que é um estado mental e uma disposição do íntimo, uma atitude da consciência, uma harmonização do espírito: e ocorreu-nos a ideia (que muitos capitularão de quimérica, absurdamente ingénua) de que alguns dos seduzidos por esse sonho humano se deveriam consagrar a realizar em si, e em torno de si, o ambiente moral para a sociedade nova, auxiliando a acção dos reformadores políticos por um trabalho modesto de apostolado puro: e como as atitudes morais que cada um adopta estão na estrita dependência de uma orientação filosófica, considerámos oportuna uma colecção de textos a que se desse com propriedade este sobretítulo comum: "manuais de iniciação na vida do espírito". Tal a interpresa que se enceta agora, com uma antologia dos pensamentos de Marco Aurélio»
.

Li os primeiros parágrafos do prefácio e apaixonei-me pelo livro. Tenho andado com ele na mala, para ler nos «intervalos», rendida à quimera absurdamente ingénua que ele encerra, feliz por descobrir que antes de eu ser nascida existiram homens que assumiram o ridículo propósito de mudar o mundo. Faz-me sentir menos só, e tudo por uns míseros cinco euros.

Haja respeito!

Julgar a conduta de alguém, designadamente de um dos nossos pares, é uma actividade penosa, difícil, impõe a quem julga cuidado, escrúpulo, ponderação, reserva, contenção, impõe respeito por quem se queixa, respeito por quem é julgado, respeito pela própria função. Respeito.

Se hoje quebro o silêncio a que voluntariamente me remeti nos últimos tempos, saibam que é, também, por respeito.

Respeito pela estagiária que já fui, pelos extraordinários Advogados que nessa altura conheci e me tratavam como se eu fosse a advogada que ainda não era, e dessa forma me ensinavam a sê-lo, e assim me mostraram como se é merecedor de respeito. Recordo em particular, e com muita saudade, o meu Bastonário Ângelo d'Almeida Ribeiro, mas também o meu Bastonário Adelino da Palma Carlos, cujo escritório foi o primeiro escritório de advogados que pisei, o ambiente de fraterna camaradagem entre colegas de várias gerações que aí encontrei, e cuja memória guardarei até ao fim dos meus dias.

Respeito pelas largas centenas de advogados estagiários que ao longo da minha vida ajudei a formar, alguns deles já com mais de uma década de exercício da profissão, que me ouviram com atenção, que aturaram os meus reparos, que se esforçaram por corresponder às minhas exigências e expectativas, que volta e meia encontro pelos tribunais, que me lembram tudo isto, de uma forma amiga, simpática, gentil.

Respeito por mim própria, que há um ano atrás senti necessidade de escrever isto, por respeito por todos aqueles jovens que, mau grado as enormes dificuldades, alimentam o sonho de, um dia, serem advogados e cuja realidade se encontra cruamente descrita aqui.

Para todos, a minha homenagem, o meu respeito.

E viva o «progresso»!

«Não vou repetir o que aqui afirmei o ano passado», referiu o Presidente da República, na 34ª Sessão Comemorativa do 25 de Abril. «Apenas direi que me impressiona que muitos jovens não saibam sequer o que foi o 25 de Abril, nem o que significou para Portugal».

Comentando este discurso há quem escreva sobre a «revolta silenciosa dos jovens cidadãos» e entenda que o Presidente «acertou na mouche ao dedicar ao alheamento dos jovens portugueses da coisa política o seu discurso comemorativo de mais um aniversário do 25 de Abril».

Mas também há quem lembre os «dez anos em que governou esta democracia, pelo dinheiro que recebeu para o fazer e pelos tostões que então investiu na educação dessa gente jovem. Parece que ficaram todos enterrados debaixo de betão ou nas malas dos jipes dos agricultores portugueses que estacionam em cima dos passeios.»

Ingratos! Se é verdade que os jovens não fazem ideia de como era nos tempos «da outra senhora», é igualmente verdade que sem o betão, o alcatrão e os jipes, produto desses dez anos de governação, terras recônditas como Vila Real nunca chegariam a figurar nas notícias de última hora a propósito da actividade nacional emergente, o «carjacking». E viva o «progresso»!

Crimes e «bolas de berlim»

No passado dia 6 li, no Público, que «ter máquinas de bolas com chocolates pode ser crime» e que, por essa razão, «o proprietário de um armazém foi recentemente detido e todo o material foi apreendido pela ASAE (...) com a justificação de que não era possível ao cliente perceber qual o chocolate a que teria direito antes de introduzir a moeda de 50 cêntimos». Lembrei-me, então, de ser miúda, e de existirem por todos os cafés, pastelarias, «lugares» ou tabernas deste país uns cartões que as crianças furavam, e que tinham lá dentro umas bolas, cuja cor ditava o tipo e o tamanho do chocolate que lhes cabia, em troca de uma moeda de cinco, dez, vinte e cinco tostões, o preço variando à medida que os anos passaram. E há quem, agora, entenda que isto pode ser crime? Pasmei...

Depois fui passar os olhos sobre as notícias do Correio da Manhã e descobri que, no dia anterior, um rapaz de 27 anos ficou sem o respectivo Mercedes quando o estacionava à porta de casa, em Odivelas. O carro foi levado por «quatro jovens, com 16, 17 e dois com 19 anos», que o ameçaram com uma faca de mato, e que acabaram por ser «apanhados pela polícia em flagrante delito». «Cadastrados e considerados extremamente perigosos pelas autoridades, os detidos foram ontem libertados pelo Tribunal de Loures. Ficaram somente obrigados a fazer apresentações periódicas nas esquadras da zona de residência». Emudeci...

Aos que, ao lerem o que agora escrevo, partilhem a minha ignorante estupefacção recomendo a leitura da notícia que encontrei aqui.

Há muito que se sabe que a manipulação dos códigos de valores em função de conveniências políticas, sociais ou económicas, vem minando a lógica natural desses códigos, mas nunca como agora isso entrou, desta maneira, pelos olhos dentro. A continuar assim, um dia destes damos conta que é menos grave assaltar transeuntes com facas de mato que ir para a praia vender bolas de Berlim...

«Comentadores de alheias decisões»

«(...) Quanto aos comentadores de alheias decisões , acho bem que se lhes sejam impostas restrições em nome do dever de reserva. Numa grande parte dos casos, esses comentadores de serviço a certos órgãos de comunicação social que existem em todas as profissões não pretendem senão a sua própria projecção e, frequentemente, como o mostrou o sociólogo Pierre Bourdieu, buscam através dos “media” o reconhecimento que não encontram no seio do grupo profissional a que pertencem. Se querem opinar sobre decisões, que assumam abertamente a posição de críticos judiciais e que se especializem nisso, mas que deixem então de ser magistrados» ( Juiz-Conselheiro Artur Costa, blog «Sine Die»)

Obrigatório ler

O texto que Alice Vieira escreveu sobre «a história da professora agredida pela aluna, numa escola do Porto», publicado aqui.

«Que picuinhas!» disse ela

«Na semana passada, Hillary Clinton contou que foi recebida por tiros de franco-atiradores numa visita à Bósnia em 1996. O actor cómico Sinbad - que viajava na comitiva da então primeira dama - ouviu a descrição e disse que a única vez que sentiu medo nessa visita foi antes de saber onde ia jantar.(...)» [Público]
Sinbad a Presidente! :-)

Que má educação! Literalmente.

«Ao primeiro toque, o telemóvel deveria voar pela janela e o seu proprietário ser posto na rua.(...) .» Acontece que a história poderá não ser bem assim: «'Era uma aula livre e a professora autorizou o uso do telemóvel e toda a gente os tinha em cima da mesa.(...)'». Será? E o que é isso de «aula livre»?

«Depois, como no caso visionado, o energúmeno levaria duas competentes bofetadas no focinho só podendo sair da sala com elas bem dadas». Ou seja, para disciplinar um energúmeno de quinze anos arranje-se outro, mais corpulento, quiçá um daqueles «gorilas» que em tempos se passeavam pelos estabelecimentos de ensino. Que óptimo. Que edificante!

Num aspecto concedo: que má educação a de certas criancinhas, como esta, que aos quinze anos faz birras como se ainda tivesse cinco; que má educação a de certos paizinhos, que nem sequer reparam que os filhos estão a crescer desta maneira; que má educação a de certos professores [não querendo afirmar que é o caso desta] que «facilitam» e «contemporizam», na esperança de agradar aos meninos, a ver se assim eles ficam mais quietinhos; que má educação a daqueles governantes, que acreditam que tudo se resolve com um pedido de desculpas do energúmeno ao professor; que má educação a daqueles cidadãos que, não fazendo a menor ideia de como se educa uma criança, oferecem pancada aos filhos dos outros. Que má educação. Literalmente.

«A reboque» do You Tube? - cont.

«Oitenta por cento dos casos de indisciplina são resolvidos com um pedido de desculpa dos alunos aos professores e o aviso de que se a situação se repetir os pais serão chamados à escola. 'Os alunos são obrigados a fazer um relatório que depois é confrontado com a versão do professor. Registámos que os alunos geralmente não mentem.'Os reincidentes são obrigados a fazer limpezas na escola e fichas de trabalho acompanhados até ficar solucionada a situação», li hoje no CM

Ainda do mesmo artigo daquele jornal:
'INCENTIVOS À DENÚNCIA' (João Grancho, responsável da Linha SOS Professor)
Correio da Manhã – Qual é a finalidade da linha SOS?
João Grancho – A linha serve para apoiar os professores que sejam alvo de actos de violência, indisciplina e situações análogas. Há também ajuda em matérias burocráticas. Há muitas situações em que existe apenas a necessidade de desabafar e outras em que quem telefona pretende auxílio no que concerne a estratégias a aplicar em casos de conflito.
– Por que é que a professora não apresentou queixa ao Conselho Executivo ?
Isso aconteceu com esta professora, mas não é caso único. Muitas vezes, não querem prejudicar os alunos porque se sentem como segundos pais. Outras vezes, pode ser a vergonha e a surpresa que uma situação destas provoca. Nós incentivamos a que os casos sejam denunciados, porque só assim podemos actuar sobre as situações.
–Uma situação com esta gravidade pode levar um docente a abandonar a profissão?
– Não tenho dados que respondam que há uma relação de causa/efeito. Alguns professores ficam com certeza constrangidos depois de uma situação destas. Em muitos casos são pessoas com vários anos de profissão que são confrontadas com uma situação que é inconcebível. A escola é um lugar em que as hierarquias deviam estar muito bem definidas.
– Como é que ajudam os professores nestas situações?
Colocamos à disposição todos os nossos serviços. Ajudamos até ao ponto que o professor pretender. Se necessitar de apoio psicológico com certeza que o damos, tal como apoio jurídico.

Finalmente, a reacção das protagonistas:

«Patrícia, de 15 anos, consciente da gravidade do que fez, teme agora a 'suspensão ou a expulsão'. 'Era uma aula livre e a professora autorizou o uso do telemóvel e toda a gente os tinha em cima da mesa. Pedi a uma amiga para ouvir uma música no telemóvel, mas o som estava baixinho', contou.»

«A professora de Francês (...) que ontem viu divulgado um vídeo na internet em que uma aluna luta com ela pela posse de um telemóvel, tem estado em casa recolhida e sem querer falar sobre o assunto (...). Face à repetição constante das imagens na abertura dos telejornais, a professora da escola Carolina Michaelis, Porto, disse a colegas que "não está habituada a andar na ribalta e que já está enojada de ver o vídeo"». Agora compreendo-a...

«A reboque» do You Tube?

«Os números mais recentes sobre a violência na escolas, compilados pelo Observatório da Segurança em Meio Escolar e divulgados no final do ano passado, davam conta de 185 agressões participadas contra professores em 2006/2007. Ou seja, em média, a cada dia que passa há um docente agredido (o ano lectivo tem cerca de 180 dias de aulas)» lê-se aqui, a propósito deste inqualificável episódio ocorrido numa escola portuguesa.

O assunto tem vindo a ser comentado nas televisões, nos jornais e na blogosfera, mas há um aspecto - a meu ver bizarro - que, tanto quanto me parece, ainda ninguém valorizou. Refere a notícia que «contactada pelo PÚBLICO, a escola escusou-se a responder a qualquer pergunta e informou apenas que tinha sido aberto um “processo de averiguações”. E disse ainda que tinha tomado conhecimento do caso ontem, quando foi avisada de que o vídeo tinha sido colocado na Internet. De acordo com o assessor de imprensa do Ministério da Educação a professora apenas apresentou queixa hoje.» Leio e não entendo. Por que razão a professora brutalizada só participou a ocorrência depois do vídeo ter sido divulgado no You Tube? Terá tido receio de represálias? Terá entendido que não valia a pena participar o ocorrido? E porque será que, perante uma aluna manifestamente descontrolada e com uma maior envergadura física, não optou por entregar-lhe o telemóvel e suspender a aula, até que a mesma saísse da sala? Em suma, por que razão aceitou o confronto físico? Se as averiguações fossem comigo, acho que começava por aqui...

«Depreciating assets»

Recebi hoje, enviado por mão amiga, este recorte de jornal:



À medida que o lia vieram-me à memória outras leituras, sobre matérias aparentemente muito distintas daquela que é objecto da notícia, mas que suscitaram em mim a mesma sensação de desconforto. Por muito irrepreensível que seja, ao nível técnico, a ciência que a usa, esta «abordagem financeira» da vida é, para mim, deveras «urticante». Aqui fica outro exemplo:

«Dentro da literatura económica (sobre o Direito), é bem conhecida a metáfora da auto-estrada avançada por Richard Posner (e também a lei de Say), segundo a qual quando se constrói uma auto-estrada, apesar desta suportar mais carros a uma velocidade média superior e portanto descongestionar o trânsito a curto prazo, a longo prazo, o número de carros irá aumentar porque se está a sinalizar os “utentes” que o sistema tem mais capacidades e responderá melhor verificando-se o agravamento do congestionamento. (...) no artigo de Nuno Garoupa, Ana Maria Simões e Vítor Silveira “é apresentado um estudo econométrico para mostrar que o crescimento contínuo do sistema judicial tem seriamente contribuído para o colapso da justiça portuguesa”. De facto, os autores identificam a expansão da “procura” da justiça com a expansão das profissões legais e judiciais, pondo em causa a habitual explicação da alteração das condições económico sociais como sustentado, por exemplo, pelo OPJP.»

Publicidade SIMPLEX - quem nos defende?

«1. O serviço “Divórcio na Hora” é um serviço privado criado através de iniciativa privada sem a colaboração ou a intervenção de serviços públicos do Ministério da Justiça. 2. Apesar da existência de serviços públicos como a “Empresa na Hora” ou a “Associação na Hora” que foram criados ao abrigo do programa SIMPLEX e do Plano Tecnológico e que entraram em funcionamento em 2005 e 2007, respectivamente, o “Divórcio na Hora”, assim como a “Procuração na Hora”, não têm qualquer relação com estes serviços nem com nenhuma iniciativa pública (...)», explica o Gabinete de Imprensa Ministério da Justiça aqui.

Curioso! Há uns meses atrás escrevi isto, convencida que o serviço "Procuração na Hora" era da responsabilidade do Governo, fazendo fé no que li aqui:



Fiz mal, está visto...

«A Arte de Calar»

Hoje, pela hora do almoço, numa livraria chamada «Pó dos Livros», que fica ali para os lados da Marquês de Tomar, encontrei um pequeno tratado sobre «A Arte de Calar», que um tal Abade Dinouart escreveu e fez publicar no lonjínquo ano de 1771 [ed. Martins Fontes, Colecção Breves Encontros, São Paulo, 2002].

Escreveu o Abade, no prefácio:
«O Cardeal Le Camus dizia ao padre Lamy de l'Oratoire, quando ele lhe ofereceu uma de suas obras, cujo título é 'A Arte de Falar'. "Eis, sem dúvida, uma excelente arte; mas quem nos dará a arte de calar?" Seria prestar um serviço essencial aos homens dar-lhes os princípios dessa arte e fazê-los convir que é de seu interesse saber colocá-los em prática. Quantos se perderam pela língua ou pela pena! Ignora-se que muitos devem a uma palavra imprudente, a escritos profanos ou ímpios, sua expatriação, sua proscrição e que seu infortúnio não pôde ainda corrigi-los?
O furor de falar, de escrever sobre a religião, sobre o governo, é como uma doença epidêmica, que contamina um grande número de cabeças entre nós. Os ignorantes, como os filósofos atuais, caíram numa espécie de delírio. Que outro nome dar a essas obras que nos sobrecarregam, das quais a verdade e o raciocínio estão proscritos, e que só contêm sarcasmos, zombarias, contos mais ou menos escandalosos? A licença é levada a tal ponto que só se pode ser considerado erudito, filósofo, desde que se fale ou escreva contra a religião, os costumes e o governo.
(...) Seja qual for o sexo e a condição dos que venham a ler esta instrução, cada um poderá tomar, do que se diz em geral, a parte que lhe toca. Não cabe a mim fazer tal aplicação e, ainda que eu tivesse essa liberdade, não poderia servir-me dela sem pecar, talvez, contra as regras do silêncio que proponho aos outros.
Como há dois meios para se explicar, um pelas palavras e outro pelos escritos e pelos livros, há também duas maneiras de calar; uma contendo a língua, outra contendo a pena. Isso me dá oportunidade de fazer as observações sobre a maneira como os escritores devem permanecer em silêncio ou se explicar em público por seus livros, segundo esta advertência ao sábio: "Há um tempo de calar e um tempo de falar"
»

Há pouco, quando dava a minha volta pelos «sítios» que diarimente visito, constatei que ainda há quem pratique esta arte. Bem haja por isso!

Saudades do futuro

(...) A abertura do novo ano judicial foi um exercício tautológico, o que legitima a dúvida sobre a sua utilidade.
Acusar uma profissão da morosidade da Justiça é irrealista, bem como afirmar que uma delas não terá qualquer responsabilidade não corresponde à realidade quotidiana dos tribunais.
Inovar sem envolver os agentes é contraproducente.
Rejeitar, sem mais, todo e qualquer movimento de inovação é retrógado.(...)
[Posição da ANJAP face à abertura solene do ano judicial]

Quem diz que já não há jovens inteligentes, hein?

Evitando o diz que disse...

Esta noite, em Évora, o Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados disse isto. Convém ler o que ele disse, antes de retirar conclusões.

Concretizando...

«O advogado que patrocinou uma acção não poderá, finda esta, intervir noutro pleito com íntima conexão com aquele outro, e no qual defenda interesses opostos ao do seu antigo constituinte», lê-se no sumário de um Acórdão do Conselho Superior, de 12.10.1979. Não podia em 1979, e continua a não poder [cfr. art.º 94.º-1 do EOA]. Foi do que me lembrei quando li isto, mais precisamente que talvez fosse conveniente tornar a dita regra obrigatória para outras categorias de pessoas, se é que ainda não é [e pelos vistos, parece que não] e pela mesma ordem de razões, de natureza ética.

Constatei, depois, que além de mim outros poderão ter lido a mesma notícia e concluído mais. A ver vamos...

Ele há...

«Estado e Lusoponte já estão a negociar indemnização»
(...)
«De um lado está o Governo, assessorado pela Vieira de Almeida (VdA)que vai alegar que o Estado está apenas obrigado a indemnizar a concessionária, no caso de futuras travessias rodoviárias acarretarem uma perda de receita para a Lusoponte. Do outro, a empresa liderada por Ferreira do Amaral (o ex-ministro responsável por este contrato), assessorada pela MLGTS a reclamar o direito à concessão da Terceira Travessia do Tejo. »

Ele há títulos...

«Ex-director nacional da PJ especializa-se em crime económico»

Justiça em números

Li aqui que durante a passada semana foi divulgado o estudo sobre “A Justiça Cível em Portugal: uma perspectiva quantitativa”, da autoria de Sofia Amaral Garcia, Nuno Garoupa e Guilherme Vasconcelos Vilaça.

Neste estudo os autores começam por «fazer um balanço do estado da arte relativo aos estudos e trabalhos realizados em Portugal nos últimos anos que, directa ou indirectamente, versam a quantificação da justiça cível», ao qual se segue «um estudo técnico exaustivo das bases de dados produzidas pelo Ministério da Justiça, as Estatísticas da Justiça».

Pelo meio encontrei uma citação, que retive:

«(...)Pierre Bourdieu, no ensaio em que aplica os seus conceitos campo, habitus e homologia ao Direito, avança a tese que “the constitution of the juridical field is inseparable from the institution of a professional monopoly over the production and sale of the particular category of products’ legal services”. O referido autor salienta ainda, que as profissões jurídicas determinam a procura jurídica através de meios muito variados, inclusive pressionando os poderes públicos no sentido de poderem contribuir para a definição do que se entende por procura jurídica. Por outro lado, reconstrói criativamente o aparecimento e expansão de novos ramos do Direito e de tendências de juridificação, entendendo-os do seguinte modo: “a process of circular reinforcement goes into action: every step toward the “juridicization” of a dimension of practice creates new “juridical needs”, and thus new juridical interests among those who, possessing the specific qualifications necessary (knowledge of labor law in this case), find in these needs a new market. Through their intervention,such practitioners cause an increase in the formalism of legal procedures, and thereby contribute to increasing the need for their own services and products, to the practical exclusion of laypeople. Laypeople are obliged to have recourse to the advice of legal professionals, who little by little will come to replace the complainants and defendants. The latter in their turn become nothing more than a group of individuals who have fallen under the jurisdiction of the courts.»

Seguida de uma interrogação:

«Porque não pegou ninguém na afirmação de Nuno Garoupa et al., segundo a qual, foi o aumento explosivo das profissões jurídicas que induziu o aumento da procura judiciária entre 1970-2004?»

Enganam-se os autores. O Ministério da Justiça já está a tratar disso.

It's the economy...

(...)
O funcionamento do sistema de justiça ainda é um obstáculo ao progresso económico e social do País.
No ano que terminou, foram aprovadas importantes reformas legislativas, fruto de um entendimento político na Assembleia da República, bem como algumas medidas de modernização dos serviços de justiça.
Mas os cidadãos e as empresas ainda não sentiram melhorias significativas na resposta do sistema judicial e continuam, legitimamente, a reclamar uma administração da justiça mais eficiente e mais célere.
Exige-se a todos os intervenientes neste processo que contribuam para o reforço da confiança da sociedade no sistema de justiça.
(...)
(mensagem de Ano Novo do Presidente da República - excerto relativo à Justiça)

Em suma:
a) «sistema de justiça» = acção executiva
b) menos pendência = mais progresso.

Que bom que é ter um Presidente economista! :-)